
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (17), por 267 votos a 116, o projeto que fragiliza as regras para o licenciamento ambiental. A proposta, que tramitava há 21 anos no Parlamento, segue agora para sanção do presidente Lula (PT), que poderá vetar trechos do texto.
Ambientalistas alertam que a medida pode reduzir o controle sobre atividades que causam degradação ambiental e ameaçar comunidades tradicionais. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), orientou a base a votar contra o projeto.
O Ministério do Meio Ambiente, chefiado por Marina Silva, também se opõe ao PL, ao contrário dos ministérios da Agricultura e de Minas e Energia, que apoiam a proposta. Deputados da Frente Parlamentar Agropecuária, defensores do texto, afirmam que o objetivo é desburocratizar a emissão de licenças ambientais.
A proposta
O projeto cria uma licença especial para obras consideradas estratégicas pelo governo federal, mesmo que envolvam alto impacto ambiental. Além disso, dispensa o licenciamento para a ampliação de estradas, atividades agropecuárias e estações de tratamento de água e esgoto até que o Brasil alcance as metas de universalização do saneamento. Barragens pequenas de irrigação e aterros sanitários também são beneficiados — neste último caso, com exigência de licença.
Outra mudança é a liberação da renovação automática da licença ambiental, com base em autodeclaração feita pela internet. A autodeclaração, já usada em alguns estados, será nacionalizada para projetos de médio porte com potencial poluidor.
O texto também exclui a necessidade de seguir as normas do Conama no licenciamento de mineração de grande porte ou alto risco, transferindo a competência aos estados e retirando o poder do órgão federal.
A proposta ainda retira a exigência de aprovação do Ibama para o corte de vegetação da Mata Atlântica, transferindo essa autorização para estados e municípios. Dois artigos da Lei da Mata Atlântica são anulados, o que permite a derrubada de matas primárias e secundárias.
Além disso, o texto ignora terras de comunidades tradicionais que ainda não possuem titulação oficial no processo de licenciamento. Apenas terras indígenas homologadas e territórios quilombolas regularizados serão considerados.
Logo após a votação, o Observatório do Clima, rede com 133 organizações, divulgou nota classificando o projeto como “o maior retrocesso ambiental legislativo desde a ditadura militar”.
A entidade afirmou: “O Congresso Nacional desmontou na madrugada desta quinta-feira o principal instrumento de controle dos impactos ambientais de empreendimentos no país. [A votação] ocorre a menos de quatro meses da COP30, a conferência do Clima da ONU que será realizada em Belém.”
O Observatório também disse que a medida será judicializada. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), declarou que o presidente Lula deve vetar trechos da proposta.
Comunidades Tradicionais
Pelo projeto, áreas ocupadas por comunidades tradicionais poderão ser alteradas sem licenciamento ambiental. A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) poderá participar da avaliação sobre territórios não homologados, mas sua decisão não terá poder para barrar obras.
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“Com a histórica omissão do Estado brasileiro em relação à conclusão dos processos de demarcação, todas as terras tradicionais pendentes de homologação ou titulação seriam desconsideradas para fins de licenciamento ambiental”, aponta um estudo do Observatório do Clima.
Segundo nota técnica do Instituto Socioambiental (ISA), 18 milhões de hectares de Terras Indígenas, Territórios Quilombolas e Unidades de Conservação previstas no PAC 2023 podem ser excluídos do licenciamento. O documento estima que 259 Terras Indígenas — cerca de um terço do total — e mais de 1,5 mil territórios quilombolas (80% dessas áreas) seriam “apagados” da legislação.
A proposta também cria a Licença Ambiental Especial (LAE) para obras “estratégicas”, mesmo que causem “significativa degradação do meio ambiente”. Para esse tipo de licença, será exigido apenas um estudo de impacto ambiental, com prazo máximo de um ano para aprovação, mais curto do que o de um licenciamento convencional.
O governo poderá classificar empreendimentos como estratégicos por decreto, após consulta ao Conselho de Governo, órgão que assessora o presidente da República na formulação de políticas e diretrizes federais.