Um dos melhores momentos do livro de Paulo Henrique Amorim sobre a imprensa, Quarto Poder: uma outra história, é uma conversa dele com um amigo de Roberto Marinho sob a condição de anonimato.
Segundo o amigo, Roberto Marinho mudaria muita coisa no Globo, caso estivesse vivo.
Particularmente, a questão da opinião, diz o amigo.
Nos tempos de RM, a opinião do Globo era a opinião dele mesmo, expressa em editoriais. Eles eram escritos por subordinados, uma vez que, como a imensa maioria dos barões de imprensa brasileiros, RM não sabia escrever.
O Globo teria, de acordo com este raciocínio, cedido sua opinião a colunistas como Merval e Míriam Leitão.
Tenho outra visão.
Colunistas como os citados acima, e tantos outros, servem na verdade aos propósitos dos donos das grandes empresas de jornalismo.
Eles transmitem aos leitores menos avisados a sensação de que o ideário de jornais e revistas não é monopolizado pelos donos.
Isso dá um falso ar de democracia à opinião de jornais como o Globo.
Na verdade, colunistas como Merval e Míriam têm completa independência para publicar artigos que reforcem as opiniões da família Marinho.
A melhor definição desse tipo de jornalista, para mim, é colunista patronal.
No caso da Globo, especificamente, as luzes dirigidas aos colunistas que dizem amém aos donos tem um benefício lateral para os acionistas.
Com o destaque, eles podem ganhar fora da empresa muito dinheiro com conferências. E isso permite à Globo pagar salários medíocres.
Era uma tática empregada na área de entretenimento que se estendeu para o jornalismo.
Lembro de um depoimento, para as memórias da Globo, de Fernanda Montenegro.
Ela dizia, essencialmente, que a Globo pagava salários baixos porque sabia que a celebridade que a emissora trazia aos atores lhes traria dinheiro com publicidade, festas de formatura e outras atividades extracurriculares.
Era uma troca.
Uma ou duas conferências de Merval, ou Míriam, ou Jabor, dão mais que um mês de salário pago pela Globo.
Sair da Globo para eles seria uma tragédia financeira não pelo que recebem na casa, mas pelo que levantam fora dela.
O maior talento dos Marinhos não é jornalismo, não é televisão, não é administração: é a arte de ganhar dinheiro.
Os colunistas que dizem amém dão sua contribuição para que a empresa mantenha sua folha de pagamentos num nível muito abaixo do que seria de esperar.
O livro O Quarto Poder traz também bastidores divertidos de figuras como Paulo Francis e suas sessões de flatulência no escritório da Globo em Nova York, que Paulo Henrique Amorim dirigiu nos anos 1990.
O melhor de PHA, para mim, viria depois disso. Ao lado de Nassif, ele foi um precursor no contraponto à brutal manipulação jornalística das empresas de jornalismo. É uma contribuição milionária à sociedade.
Hoje, ele produz os melhores vídeos críticos do que sai na mídia, com uma mistura de galhofa e extrema agudeza política.
Gostaria de ver mais do Conversa Afiada num eventual próximo livro de PHA.
No mais, minha maior curiosidade em relação ao livro é a seguinte: por que PHA não lhe deu o nome de PIG, a expressão que ele consagrou em seu site?