Rosa Weber parece perdida num momento em que o Brasil precisa da coragem dos juízes. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 21 de outubro de 2018 às 21:52

Terminou há pouco a coletiva de imprensa realizada pelo Tribunal Superior Eleitoral, sem que fosse dada a resposta básica: são legítimas as eleições em que o poder econômico tem demonstrado força decisiva?

A resposta ficou ausente em razão da forma como o evento foi realizado: Rosa Weber reuniu autoridades públicas e o presidente da OAB, Carlos Lamachia, para tentar demonstrar que o processo eleitoral é seguro.

Era uma peça de propaganda, chatíssima, até que os jornalistas começaram a fazer perguntas. Ainda assim, faltou o questionamento básico: todos perguntaram sobre o fake news, quando, a rigor, a questão mais importante era outra: o abuso do poder econômico.

Falando sobre fake news, o general Sérgio Etchegoyen chegou a citar Adão e Eva, mas não respondeu ao essencial: não há inteligência de Estado no Brasil capaz de detectar o movimento organizado para a propagação de fake news?

A participação de Etchegoyen, representante de um poder político, num evento da Justiça já é, por si só, estranha, mas, como ele tem sob sua jurisdição a ABIN, as respostas devem ser consideradas.

Etchegoyen lembrou que a Adão e Eva foram expulsos do paraíso por conta de uma fake news, propagada pela cobra, personagem não citada por ele. Fez essa citação para dizer que fake news sempre existiram.

É verdade, mas o que deveria estar em foco não é a disposição humana para propagar a mentira, mas o uso de um financiamento ilegal milionário para amplificar essa divulgação e, com isso, interferir no resultado eleitoral.

Sim, porque a denúncia original que gerou crise de confiabilidade no sistema eleitoral dá conta de que os empresários estariam gastando milhões para fazer disparos massivos pelo WhatsApp – com uma plataforma que permite atingir a todos os usuários de rede de comunicação do país.

Para isso, é preciso gastar 12 milhões de reais, por um único disparo. Segundo a Folha de S. Paulo, autora da reportagem, a Havan, do empresário Luciano Hang, é uma das empresas que utilizaram esse esquema.

Em vídeo, o próprio Luciano Hang confessou que estava fazendo disparos de vídeo pela internet, deixando de lado suas atividades empresariais propriamente ditas para atuar como cabo eleitoral de Jair Bolsonaro.

Como cidadão, Hang ou qualquer outro empresário podem participar das eleições e apoiar candidatos. O que é vedado é usar dinheiro de empresa para isso. Além disso, como a ação é de campanha eleitoral, deveria constar na prestação de contas de Jair Bolsonaro.

Se não aparecer na prestação de contas, o gasto poderá ser considerado caixa 2, que é crime e pode levar à impugnação da candidatura.

Jornalistas brasileiros e estrangeiros insistiram na pergunta a Rosa Weber sobre as consequências desta denúncia. “As eleições poderão ser canceladas?”, questionou o representante do Wall Street Journal.

Rosa Weber não respondeu, com argumento de que, sendo uma juíza antiga — com mais de 40 anos de atuação —, ela atende ao princípio previsto na Lei Orgânica da Magistratura de que não pode falar fora dos autos, em ação que poderá vir a julgar.

Adiantou, porém, que tem uma interpretação diferente da do seu antecessor na presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luiz Fux, que chegou a dizer que a propagação organizada de fake news poderia levar à cassação da candidatura.

Rosa Weber, em vários momentos, reclamava que não podia ouvir as perguntas dos jornalistas. Chegou a dizer que poderia ter algum problema auditivo ou que o sistema de som da corte não estaria funcionando bem.

Os demais participantes da mesa ajudavam a presidente, repetindo a pergunta.

Rosa, com essas manifestações, transparecia nervosismo e, numa das respostas que deu sobre o que faria em relação à indústria de fake news, cometeu um ato falho, e repetiu uma frase que, se efetivamente coerente com sua consciência, deveria ter norteado seu voto no habeas corpus negado a Lula, em abril:

“Os cidadãos são todos absolutamente inocentes até prova e condenação transitada em julgado, em contrário. Este é o meu posicionamento pessoal, e nós temos uma Constituição Federal.

Naquele julgamento, Rosa Weber colocou o princípio da colegialidade acima de seu entendimento pessoal, o que vale dizer acima da consciência.

Nunca é demais lembrar que foi um julgamento em que houve pressões explicitas de órgãos de imprensa  (Globo sobretudo) e até do comandante do Exército, para que o Supremo Tribunal Federal não concedesse a medida solicitada por Lula.

O ex-presidente queria apenas que fosse respeitado o princípio constitucional da presunção de inocência e não fosse preso, em sintonia com que diz o artigo 283 do Código de Processo Penal: ninguém será preso no Brasil até sentença transitada em julgado.

Hoje Rosa Weber, se esquivando de responder se Bolsonaro poderia ter a candidatura cassada, levou a coletiva até o final, com o propósito de deixar claro que as urnas eletrônicas são seguras (Bolsonaro e seus seguidores é que dizem que não são).

Rosa Weber repetiu o que deveria ser óbvio — mas deixou ser:

“A garantia do Brasil é que nós vivemos numa democracia, e a democracia tem regras. As regras têm de ser observadas.”

No final, fez um apelo:

“Eu quero registrar que nós estamos a uma semana das eleições e eu conclamo a todos, a todo o povo brasileiro, a todos os eleitores aptos a exercerem o direito ao voto — somos quase 150 milhões — à paz, ao equilíbrio, à tolerância e ao diálogo, para o bem do Brasil. O Brasil merece isso.”

Como candidato, Bolsonaro já colocou o TSE contra a parede. Imagine-se o que acontecerá em caso de vitória na eleição.

Este foi apenas um dos dias dificílimos na vida de autoridades como Rosa Weber.

Na dúvida, que sigam a Constituição.

Mas não é isso o que tem ocorrido, e Bolsonaro avança nesse vácuo.

No julgamento em que o STF negou habeas corpus a Lula, um articulista vinculado à Globo chegou a fazer um trocadilho, para tentar influenciar no resultado da sessão.

Comparou-a a Rosa de Umberto Eco: “Em nome da Rosa”, escreveu ele, em artigo publicado em O Globo, para destacar a sua suavidade — estranho, já que o que ele queria era que Rosa concordasse em jogar Lula no cárcere.

Vendo a ministra nervosa na sessão de hoje, seria mais apropriado compará-la a outra Rosa, a de Hiroshima, símbolo da destruição.

Pobre Rosa…

Terá ela força para enfrentar o cabo e o soldado quando eles estiveram à frente da corte para fechá-la?

Em vídeo gravado, o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do candidato a presidente Jair Bolsonaro e o deputado federal mais votado na história do Brasil, para fechar o STF não precisa nem mandar Jeep, basta um cabo e um soldado.

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Outro momento em que Rosa Weber pareceu vacilante foi quando respondeu à pergunta sobre o desafio explícito de Eduardo Bolsonaro à autoridade do STF — a última instância da Justiça. “Me foi trazido o vídeo e também me foi trazido ao conhecimento que o vídeo foi desautorizado pelo candidato”.

Na verdade, Bolsonaro questionou a veracidade da frase — como sempre faz, na dúvida desqualifica a evidência, “alguém já viu um áudio meu desrespeitando mulher?”. Para ele, a frase teria sido tirada de contexto. Para eliminar qualquer duvida, confira no vídeo abaixo  o que disse Eduardo Bolsonaro: