Sakamoto: Bolsonaro derrete tornozeleira e, junto, o discurso de seus aliados

Atualizado em 22 de novembro de 2025 às 19:20
Tornozeleira danificada por Jair Bolsonaro

Por Leonardo Sakamoto, no Uol

Afirmar que Jair Bolsonaro não estava tentando fugir após um vídeo mostrar o ex-presidente confessando que derreteu a tornozeleira eletrônica com um ferro de solda é tratar o brasileiro como idiota. As imagens vieram a público após aliados gastarem a manhã jurando que era apenas um defeito no equipamento. Um defeito quente, pelo visto.

Ele podia estar grogue de algum remédio na hora em que teve que se explicar à polícia, como defenderam seus aliados à Carla Araújo, no UOL. Mas, no vídeo, o próprio ex-presidente disse à servidora da administração penitenciária do Distrito Federal que o processo de queima da tornozeleira começou na tarde de ontem. Foi um derretimento em volta de todo o aparelho, ele sabia o que estava fazendo.

As imagens e o áudio seriam provas mais do que suficientes para decretar uma prisão preventiva, nem sendo necessário conjugar isso com a vigília que foi aclamada pelo seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, com o objetivo de gerar tumulto à ordem pública. Ele não estava testando apenas até onde a tornozeleira iria sem apitar à central, também estava verificando os limites das instituições e da República.

Se um rapaz pobre da periferia de São Paulo que tivesse sido preso por roubo e, por sorte, estivesse esperando o julgamento em liberdade, tentasse derreter a sua tornozeleira como faca quente na manteiga, esse mesmo pessoal que minimiza o que Jair fez não ia dar mole, não. Estaria pedindo prisão perpétua e esculacho no camburão.

Em vez disso, quando se trata de Bolsonaro, seus defensores preferem fabricar versões alternativas da realidade, como se o país inteiro fosse obrigado a acreditar em contos de fada para adulto armado. Essa insistência em negar o óbvio não é apenas patética: é perigosa, porque normaliza a ideia de que alguns podem burlar a lei sem enfrentar consequências.

No fundo, o que estão defendendo não é Bolsonaro, mas o privilégio de construir a realidade a partir de ficção e não de fatos. E enquanto essa lógica prosperar, a democracia seguirá sendo tratada como tornozeleira de plástico: algo que eles acham que podem derreter quando bem entenderem.