
Por Leonardo Sakamoto, publicado originalmente no UOL
Tal como a impunidade pelo golpe de 1964 levou um naco dos militares a se aliar em nome de um golpe sob o bolsonarismo, a anistia sobre aqueles que atentaram contra o Estado democrático de Direito abre a porteira para mais ataques a bomba e agressões contra autoridades nos próximos anos. Vai “passar a boiada” da violência contra as instituições, engravidando o futuro de novas intentonas.
O bolsonarismo e seus aliados no centrão tentam convencer que o melhor para o país é um arranjo para não punir ninguém pelos crimes cometidos a fim de “pacificar” o Brasil. Punição dos culpados é que vai pacificar o país, como pode ser verificado por uma criança em qualquer livro de história que retrate como as nações lidaram com aqueles que tentaram se manter no poder à força.
A aprovação de uma anistia ao ex-presidente, seus cúmplices e seguidores está sendo discutida no Congresso Nacional. Mesmo que aprovada, será declarada inconstitucional pelo STF. Até que a extrema direita tenha maioria para o impeachment de ministros do tribunal no Senado, Bolsonaro seguirá preso após sua condenação. Contudo, a mensagem que o Poder Legislativo passará é: pode cometer esse tipo de crime que a gente mata no peito, pois cadeia é para quem rouba bife e xampu, não para quem tenta implementar uma ditadura.
Ao detonar bombas na Praça dos Três Poderes, em Brasília, e depois se explodir na frente do Supremo Tribunal Federal, em 13 de novembro do ano passado, Francisco Wanderley Luiz, vulgo “Tiu França”, um chaveiro catarinense, candidato derrotado à Câmara dos Vereadores de Rio do Sul (SC) pelo PL de Bolsonaro, mostrou o que acontece quando punições rigorosas não são dadas a quem tenta derrubar a democracia.
Já, em 29 de dezembro, o corretor de imóveis Lucas Ribeiro Leitão, de Fortaleza, foi preso após ser detido a caminho de Brasília por equipes da Divisão de Proteção e Combate ao Extremismo Violento da Polícia Civil do DF. Ele confessou que planejava um ataque à capital federal.
E, um dia antes, o advogado Fabrízio Domingues Ferreira ameaçou explodir as sedes da Polícia Militar e da Polícia Federal no Distrito Federal, e disse que já estaria com as bombas. A PM não encontrou explosivos com ele e apontou que estava em surto psicótico.
Enquanto os líderes da tentativa de golpe de 2022 não forem punidos, a mensagem é de incentivo a esse tipo de coisa. O exemplo que vem de cima pode ativar gatilhos de pessoas comuns, dando um sentido à sua existência.

E uma sensação de que não está cometendo um crime, mas sendo um herói e um mártir.
Como já disse aqui um rosário de vezes, do ponto de vista prático, pouco importa se os envolvidos tinham problemas mentais ou se estavam profundamente perturbados. Esse tipo de atentado contra as sedes de instituições públicas não era uma preocupação do país. Eles foram inspirados por aqueles que arquitetaram o golpe em 2022 e permanecem sem punição.
A esses planos, outros podem ser incluídos, como a bomba colocada em um caminhão de combustível para explodir o aeroporto de Brasília na véspera de Natal de 2022. Os envolvidos queriam que as centenas de mortes decorrentes do ato terrorista abrissem caminho para a intervenção das Forças Armadas.
Ou os veículos que foram incendiados em Brasília, espalhando o terror, em 12 de novembro de 2022, dia da diplomação de Lula e Alckmin no TSE, após bolsonaristas tentarem libertar um aliado preso na Polícia Federal.
Atentados não foram planejados apenas por civis. O plano “Punhal Verde e Amarelo” previa o assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes por integrantes das forças especiais do Exército e quase teve sucesso.
Cabe às instituições e à sociedade darem um fim nesse explosivo círculo vicioso. Quem votar pela anistia, estará sendo corresponsável pelos ataques que ocorrerem no país contra instituições a partir daí. Daí quem não vai anistiá-lo é a História.