Sessenta socos na namorada e uma desculpa que insulta um país inteiro. Por Nathalí

Atualizado em 29 de julho de 2025 às 13:55
O ex-jogador de basquete Igor Cabral. Foto: Reprodução

Sessenta socos. Convencido da própria impunidade, Igor Cabral, ex-atleta profissional de basquete, desferiu 60 socos na namorada Juliana Garcia diante de uma câmera de elevador.

A mulher ficou com o rosto desfigurado, foi socorrida por vizinhos e terá que se submeter a diversas cirurgias para amenizar o estrago. Essa mulher jamais entrará num elevador com um homem e jamais esquecerá esse episódio traumático: mais do que as dores físicas, dói na alma. Esse homem, sem dúvida alguma, acabou com a vida de Juliana Garcia.

Ele foi preso em flagrante graças à rapidez do segurança do condomínio — um homem de rara empatia, uma vez que, no universo masculino, o que mais tem é homem passando pano pra violência de outro homem.

Esse é o nível de impunidade que temos permitido — não apenas os governos, mas nós, o povo.
Isso é caso de protesto na rua, mas a maioria das pessoas apenas consome a notícia (como consome qualquer coisa), sem a devida reflexão. Cadê os movimentos de mulheres nas ruas? – isso não é uma ofensa, é uma provocação para que mulheres, em marcha, digam uma vez mais que violência e feminicídio não serão tolerados.

Sim, porque não foi “apenas” uma surra: 60 socos configuram tentativa de feminicídio e assim devem ser tratados pela justiça.

E por falar em justiça, me declaro contra o punitivismo sempre que posso, mas nesse caso eu gostaria — perdão pela confissão sinistra — que esse homem não apenas fosse preso, mas linchado por outros presidiários, como se faz com estupradores. Já que a justiça não funciona, que ao menos haja revolta dentro da cadeia por um crime tão brutal.

Em depoimento à polícia, o monstro disse, pasmem: tudo não passou de uma crise de claustrofobia.
Com licença, leitores: claustrofobia é meu grelo, meu anjo.

O que você tem é temperamento violento e falta de caráter. Na minha terra, chamam isso de sangue ruim.

E sabe o que é pior? Não faltarão advogados de porta de cadeia que sustentem essa tese, e quem sabe até um juiz que faça o que (quase) todo homem faz: ser indulgente com a violência de outro homem.

Sim, há machismo no meio esportivo, mas não considero que um crime tão brutal tenha relação apenas com a cultura da violência contra a mulher. Igor não é vítima de uma socialização podre — ele é o próprio chorume.
Não foi vítima de crise claustrofóbica (que nem de longe justificaria esse crime): ele é simplesmente um agressor sanguinário que deve ser tirado do convívio social até o fim de sua vida.

Ninguém bate sessenta vezes no rosto da própria namorada por uma questão cultural apenas: essa monstruosidade nasceu com ele e deve ser associada a ele próprio, porque as questões culturais, embora relevantíssimas, não explicam tudo. Tampouco doenças mentais — se ele as tivesse — devem ser empregadas como justificativa para esse verdadeiro massacre de uma mulher só.

Não vi as imagens. Não verei. Mas deixo aqui minha solidariedade à Juliana Garcia e minhas congratulações ao porteiro — que não fez mais que a obrigação dele, mas nos mostrou que ainda existem homens humanos, algo atualmente tão difícil de encontrar.

Igor Cabral é um violentador dos mais perversos e tem que apodrecer na cadeia, tomando três surras por dia. Espero que seus colegas de cela saibam a quantidade de socos e façam o que a justiça comum se recusa.

Nathalí Macedo
Nathalí Macedo, escritora baiana com 15 anos de experiência e 3 livros publicados: As mulheres que possuo (2014), Ser adulta e outras banalidades (2017) e A tragédia política como entretenimento (2023). Doutora em crítica cultural. Escreve, pinta e borda.