Sete razões para ser a favor da descriminalização do aborto. Por Nathali Macedo

Atualizado em 1 de dezembro de 2016 às 11:13
Captura de Tela 2016-12-01 às 12.02.28
Sendo o corpo dela, a escolha também deveria ser

Em meio a essa semana sombria de tragédia aérea e tragédia política – a esperada aprovação da PEC da morte – eis uma notícia que nos acalanta: Demos um passo importante para a descriminalização do aborto no Brasil.

A maioria da primeira turma do STF (Supremo Tribunal Federal) firmou o entendimento de que praticar aborto nos três primeiros meses de gestação não é crime. Os ministros responsáveis pela decisão são Luís Roberto Barroso,Edson Fachin e Rosa Weber.

Bastou que a decisão fosse publicizada para que surgissem nas redes conservadores indignados levantando-se contra as “mulheres assassinas de criancinhas.” Em favor da descriminalização do aborto, mas, antes mesmo disto, contra a ignorância, listo aqui 7 razões pelas quais a descriminalização do aborto é necessária e urgente.

1 – A descriminalização do aborto é uma questão de saúde pública

Ninguém é a favor do aborto.

Acontece que, existindo ou não leis que o proíbam, o aborto continua a ser praticado – segundo a Organização Mundial de Saúde, são 20 milhões de abortos clandestinos por ano no mundo – e continua a matar mulheres. Ainda segundo a OMS, uma mulher morre a cada nove minutos vítima de abortos clandestinos.

O que defendemos, portanto, é a descriminalização do aborto como questão de saúde pública, para que o Estado pare de violentar mulheres através de suas leis.

Necessário, aliás, neste ponto, que façamos um recorte: quem são as mulheres que morrem vítimas de abortos clandestinos? As pobres, negras e periféricas. As ricas, em geral, conseguem abortar seguramente em clínicas clandestinas por uma bagatela de três a cinco mil reais.

Importa, portanto, saber que a proibição do aborto não é eficaz em fazer com que as mulheres deixem de abortar, mas é muito eficaz em matar mulheres pobres, negras e periféricas.

2 – Motivações religiosas não interessam a questões coletivas

Como já dissemos, e não cansaremos de repetir, a Bíblia não é Constituição.

A bancada evangélica – um parêntese: o fato de existir uma bancada evangélica em um país laico é, por si só, vergonhoso – está a postos para barrar qualquer avanço que o Brasil ouse dar em direção à descriminalização do aborto (e dessa vez não será diferente), mas é de uma estupidez infinita valer-se de argumentos religiosos em uma discussão que diz respeito às mulheres de todas as religiões, inclusive às que não se identificam com religião alguma.

Aborto é uma questão social e política, jamais religiosa.

3 – A maternidade é compulsória, a paternidade não

Apenas no Brasil, mais de cinco milhões de crianças não têm o nome do pai no registro de nascimento, sem falar nos “pais de papel”, que registram os filhos e seguem suas vidas como se nada tivesse acontecido, mas quando a questão da descriminalização é levantada, brotam homens em todos os cantos opinando onde não foram chamados.

Por que tantos homens abandonam seus filhos?

Porque eles podem fazer isso. Porque a sociedade não os julga moralmente e o Estado não os obriga com alguma eficiência a assistirem afetivamente sua prole. Uma mulher que abandona um filho é um monstro para a mídia, para o Estado e para a sociedade. Um homem que abandona um filho é apenas mais um homem.

Se a maternidade é compulsória e a paternidade não o é, cabe apenas a nós, mulheres, discutirmos sobre os caminhos da descriminalização do aborto no Brasil.

4 – O feto não sente dor

A informação é de um estudo realizado pelo The Guardian: o feto humano não sente dor durante as primeiras vinte e quatro semanas de gestação, porque suas terminações nervosas são formadas apenas após a vigésima quarta semana.

Do mesmo modo, a esta altura, o feto também não desenvolveu consciência – logo, não é exposto a nenhum tipo de sofrimento durante o procedimento abortivo.

Portanto você, conservador, tão preocupado com as dores de um embrião fecundado, mas tão indiferente às vidas das mulheres vítimas de abortos clandestinos, pode dormir tranquilo.

5 – A descriminalização não gerará a banalização do aborto

Uma mulher não quer abortar como quem quer ir ao cinema. É estúpido, portanto, agir como se o aborto fosse, de alguma maneira, desejável para qualquer mulher.

Ainda segundo a Organização Mundial de Saúde, países com leis que proíbem o aborto não conseguiram evitar a prática e que contam atualmente com taxas maiores do que nos países em que o aborto é legalizado.

Isso porque a descriminalização é acompanhada de uma estratégia séria de planejamento familiar e acompanhamento psiquiátrico.

O aborto não se transformará no esporte favorito das mulheres brasileiras acaso seja legalizado – muito pelo contrário, aliás.

6 – Métodos contraceptivos falham

Uma pesquisa realizada pela UnB (Universidade de Brasília) apontou que entre 70,8% e 90,5% das mulheres que praticam o aborto no Brasil já têm outros filhos e fazem uso de métodos contraceptivos regularmente – o que reforça a tese de que o aborto seria medida de planejamento reprodutivo – empregado em último caso, quando os outros métodos contraceptivos falharam.

Importa dizer, ainda, que, comprovadamente, não há nenhum método contraceptivo totalmente seguro. Isso significa que o aborto não é uma prática que busca meramente corrigir a negligência do mau uso dos métodos contraceptivos.

Por fim, é certo que defender o prosseguimento da gestação como punição pela negligência dos pais no que se refere a métodos contraceptivos pressupõe que filhos indesejados funcionam como “punições.”

Crianças não são punições.

7 – Ser contra o aborto não é ser pró-vida

O discurso pró-vida é o menos lógico e mais cansativo de todos os discursos anti-aborto.

Não há nada de moralmente admirável em defender o nascimento de uma criança indesejada, que provavelmente chegará ao mundo sem aparato material ou afetivo adequados e crescerá em condições adversas. Se esta criança, pelo seu histórico de privações, sucumbir ao crime, este mesmo conservador pró-vida dirá que “bandido bom é bandido morto”.

Querer que a criança nasça sem se importar com o tipo de vida que ela terá não é ser pró-vida, é ser pró-nascimento.