Sheherazade é o troféu que Bolsonaro queria para ajudar Sílvio Santos a levar a Libertadores? Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 9 de setembro de 2020 às 8:26
Sheherazade, a cobiça Libertadores e os novos amigos Bolsonaro e Sílvio Santos

Há alguns meses, o SBT arquivou o projeto de recriar o Aqui Agora por falta de recursos.

Hoje, a emissora confirma que está negociando contrato para transmitir a Libertadores da América.

A rede de Sílvio Santos não fala em valores, mas, considerando o que a Globo pagava, sabe-se que precisará dispor de muito dinheiro para ter direito de transmitir a principal competição de futebol das Américas.

A Globo pagava 60 milhões de dólares (cerca de R$ 320 milhões) para transmitir duas partidas de clubes brasileiros nas quartas-feiras.

Tentou reduzir o valor em razão da pandemia, mas a Conmebol, detentora dos direitos, não aceitou. Por essa razão, o contrato foi rescindido.

A receita regular do SBT não mudou muito desde que o projeto Aqui Agora foi abandonado e aí surge a pergunta: o que alterou?

O ministro das Comunicações.

A pasta foi entregue a Fábio Faria, genro de Sílvio Santos, depois de decisões seguidas do dono da rede proibindo críticas a Bolsonaro.

Ele chegou divulgar um comunicado interno.

“A minha concessão de televisão pertence ao governo federal e eu jamais me colocaria contra qualquer decisão do meu ‘patrão’, que é o dono da minha concessão. Nunca acreditei que um empregado ficasse contra o dono, ou ele aceita a opinião do chefe, ou então arranja outro emprego”, dizia a nota interna assinada por ele.

Um mês depois, Sílvio Santos cancelou o SBT Brasil para evitar a repercussão do vídeo tornado público na véspera, em que Bolsonaro anunciou a seu ministério a intenção de interferir na PF.

Nessa reunião, Bolsonaro também defendeu o armamento da população para enfrentar prefeitos e governadores. Em outras palavras, defendeu guerra civil.

Hoje, no mesmo dia em que confirma a negociação para ter a Libertadores, o SBT fez o mercado saber que não renovará o contrato da jornalista Rachel Sheherazade, que está na emissora desde 2012 e, depois de ser identificada com posições de direita, passou a ser crítica severa de Jair Bolsonaro e do bolsonarismo.

Um detalhe que revela a perversidade que caracterizou anúncio: hoje é aniversário da apresentadora.

Se Bolsonaro está por trás dessas mudanças que podem levar anunciantes ao SBT — talvez Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal ou Petrobras — , é algo que logo se saberá.

Caso feche o contrato com a Conmebol, o SBT já fará transmissões a partir de quarta-feira da semana que vem.

SBT e Conmebol anunciam que o contrato em negociação terá validade até 2022, último ano do mandato de Jair Bolsonaro.

Não é a primeira vez que a Libertadores é usada para tentar alavancar uma emissora por razões políticas.

No início dos anos 90, com incentivo de Fernando Collor, um político do Paraná, José Carlos Martinez, e seu irmão, Flávio, criaram uma rede de TV a que deram o nome de CNT.

O carro-chefe de audiência era a Libertadores e, para transmiti-la, a emissora tirou da Globo Galvão Bueno.

O sonho durou pouco.

Depois que Collor caiu, em setembro de 1992, a rede entrou em crise e deu calote até nos funcionários, inclusive Galvão Bueno, que recebia na época o maior salário da televisão brasileira.

Com Fábio Faria, Bolsonaro prepara uma ofensiva no campo das comunicações que vão além da transferência da Libertadores.

Por iniciativa de Fábio Wajgarten, chefe da Secom, o jornalista José Emílio Ambrósio foi convidado para presidir a EBC, responsável pela TV Brasil.

José Emílio foi diretor de operações em esportes e jornalismo da Globo por 14 anos e superintendente de esportes e jornalismo da RedeTV por 11 anos, além de dirigir do departamento de esportes da Band até maio deste ano.

O salário do presidente da EBC é R$ 29,5 mil — bem inferior ao que recebia nas redes de TV comerciais.

Outro que foi convidado para integrar a equipe da EBC, como diretor de programação, é Alan Eduardo Rapp, com salário de R$ 25,1 mil.

Alan Rapp foi diretor do Pânico na Band entre 2012 e 2017. Atualmente é diretor do programa Stand Up na Jovem Pan.

Nos cico anos em que ajudou a produzir o Pânico, o programa colecionou processos.

Em 2014, o Pânico foi condenado a pagar R$ 20 mil por dano à imagem e à honra do ator David Pinheiro — Alan Rapp aparece como réu. Eles haviam sugerido que o ator estava morto e, depois, disseram que ele “estava vivo, mas na geladeira havia 10 anos”.

Em 2017, Alan, Wellington Muniz, o “Ceará”, e o produtor Marcelo Picon, o “Bolinha”, foram condenados a pagar R$100 mil a Aguinaldo Silva por danos morais. Segundo o processo, eles usaram a imagem do autor da Globo de forma pejorativa e ofenderam sua honra.

Em 2018, um ano depois do fim do programa, o ex-diretor, juntamente com a emissora e outros membros do programa, foi condenado a pagar R$ 300 mil a Luana Piovani por danos morais.

Segundo o processo, os apresentadores a chamaram de “piranha” e expuseram a atriz e seu marido, Pedro Scooby, em “momentos de lazer e privacidade”.

No ano passado, Alan Rapp processou a Band, que transmitia o Pânico. Segundo ele, houve vínculo empregatício com a emissora entre 2012 e 2017, mas não teve a carteira assinada.

Ele pede uma indenização de R$ 1,6 milhões. Segundo o processo, este é o valor que a emissora deixou de lhe pagar enquanto dirigia o programa.

Em abril, dois anos depois do fim do programa, Alan expos suas mágoas em relação a antigos colegas.

O Pânico na Band foi lembrado por ele como “bons tempos”, mas houve críticas a ex-colegas de “má índole”.

“Sinto saúdes dos bons tempos e das pessoas de bom caráter, as de má índole estou fora”, afirmou, em sua rede social.

Alan teria sido indicado a Fábio Faria por Sabrina Sato, com quem trabalhou no Pânico. Sabrina Sato foi namorada de Fábio Faria. Procurado por WhatsApp, Alan não retornou.

Já José Emílio Ambrósio negou que tenha sido indicado a Fábio Faria por profissionais de televisão, principalmente do SBT.

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Caique Lima colaborou nesta reportagem.