O governo resolveu baratear a compra de carros “populares”. As aspas são necessárias, porque, afinal, os mais baratos deles vão ficar na faixa dos R$ 60 mil.
Abre mão da arrecadação de impostos – que poderiam financiar saúde, educação, segurança – para permitir que a classe média baixa realize o sonho do carro zero. Quem ganha com isso?
Só as montadoras.
Ao anunciar a medida, o vice-presidente Geraldo Alckmin enalteceu seu impacto social, mas ele é nulo. Os pobres mesmo continuam sem acesso a esse mercado. E a classe média é estimulada a se pendurar em prestações infindáveis, com seu fetichismo do carro próprio sendo estimulado pelo Estado brasileiro.
O impacto na atividade econômica e no emprego é minúsculo.
A opção preferencial pelo automóvel particular é nociva para o meio ambiente e um fator central de degradação da vida urbana. Torna nossas cidades imensos desertos asfaltados – pistas e mais pistas, estacionamentos e mais estacionamentos – nos quais perdemos nosso tempo em engarrafamentos cada vez mais longos.
O fetiche do automóvel é alimentado, por um lado, por uma máquina de propaganda poderosa. Por outro, pela selva urbana. Por pior que seja ter um carro, é pior ainda não ter, se o transporte coletivo é precário e insuficiente.
Parece que o governo acha que vai conquistar uma fatia do eleitorado de Bolsonaro – que ganhou por larga margem no grupo potencialmente “beneficiado” pelos automóveis mais baratos. Se é isso mesmo, há uma grave incompreensão da dinâmica atual da política brasileira.
Perde a chance de afirmar seu compromisso com o transporte público, com o meio ambiente, com um projeto efetivo de desenvolvimento, com uma política tributária voltada aos mais pobres e com o combate ao consumismo predatório.