
Um dado nos conforta no meio dos números assustadores das pesquisas sobre o apoio da população à chacina no Rio. Segundo o Datafolha, os jovens de 16 a 24 anos são o único subgrupo com posição majoritária de rejeição à operação que levou à matança. Uma rejeição de 59%.
Parece uma informação localizada sobre uma questão específica e restrita a jovens do Rio e da região metropolitana alcançados pela pesquisa. Mas é mais do que isso. Os 59% de jovens contra a matança fazem parte de uma população que apoia a ‘operação’.
Os subgrupos são divididos na pesquisa em gênero, idade, classe social por renda, escolaridade. Todos os subgrupos apoiam o que aconteceu, menos o dos jovens.
É bom saber que a rejeição manifestada por eles é maior do que o apoio dos moradores em geral. Outro dado que nos consola: as pesquisas mostram que moradores do Rio em geral e das favelas, em particular, expressam o maior apoio à chacina.
E que o apoio é um pouco menor, mesmo que ainda majoritário, quando inclui eleitores de outros Estados. Isso pode significar que a repulsa dos jovens do país todo deve ter índice maior do que os 59% registrados pelo Datafolha entre os jovens do Rio. Só o instituto, se ouvir todos os brasileiros, poderá confirmar ou não essa hipótese.
O dado dos 59% de rejeição à chacina nos oferece a chance de pensar que há salvação, por reafirmar que o jovem brasileiro não aderiu aos apelos do fascismo, como ocorreu, para dar dois exemplos inevitáveis, nos Estados Unidos e na Argentina.
Nos Estados Unidos de maioria de jovens trumpistas, Charlie Kirk era um fenômeno jovem surgido entre os jovens. Foi assassinado em setembro falando para jovens universitários. Há uma disputa entre jovens republicanos para saber quem vai substituí-lo.

Hoje, haveria pelo menos uma dezena de jovens de exceção na ponta dessa gincana, dentro de partidos, universidades, igrejas e entidades comunitárias, e alguns são apenas adolescentes. Todos querem ser o novo Kirk. Incluindo Erika, a viúva do extremista.
Na Argentina, Javier Milei foi eleito com apoio maciço calculado em torno de 70% dos jovens de até 25 anos. Quando assumiu, em dezembro de 2023, uma pesquisa da consultoria Reale Dallatorre informou o seguinte: 76% dos jovens de 16 a 25 anos têm uma imagem positiva de Milei, e 78% confiam que ele vai se sair bem no governo.
Os jovens que protestam contra o governo ao lado dos aposentados, nas ruas de Buenos Aires, todas as quartas-feiras, mostram a cara visível da resistência ao fascismo.
Mas são minoritários. Tanto que o peronismo perdeu a eleição parlamentar de outubro até na província peronista de Buenos Aires. Os jovens ajudaram a assegurar o que pode ter sido um segundo mandato antecipado a Milei.
No Brasil, o mesmo Datafolha que nos mostra agora os jovens em posição de rejeição à matança já nos mostrou muitas vezes que eles não votaram em maioria em Bolsonaro. Que desejam ver Bolsonaro preso (54% em setembro), mais do que qualquer outro subgrupo. E que combatem o projeto de anistia aos golpistas também com os mais altos índices das pesquisas.
A renovação da direita e da extrema direita teve, muito mais do que as esquerdas, o reforço de novas caras jovens. Mas isso não configura a ascensão de fenômenos gerados entre redutos e contingentes jovens de massa e organizados.
Nikolas Ferreira, talvez o maior fenômeno eleitoral jovem da extrema direita, está nessa situação. Tem apoio do nicho jovem do fascismo, e com forte base religiosa orgânica, mas não pode ser considerado um fenômeno da juventude organizada de direita e com discurso produzido para os jovens.
Nikolas fala mesmo para o tiozão do zap. Tanto que não atraiu jovens às aglomerações bolsonaristas promovidas por Malafaia em São Paulo. Os jovens líderes bolsonaristas não são nem uma imitação de Charlie Kirk.
O americano falava para seu público pelas redes e também, à moda antiga, para estudantes sentados na grama de um campus, porque foi dali que ele saiu.
Tudo isso é do conjunto dos nossos consolos políticos. O fascista brasileiro não conseguiu elaborar apelos antissistema, anticasta ou com retórica disruptiva dirigidos aos jovens. A retórica mais básica, do Deus e da família que pregam a morte, é a que funciona.
Direita e extrema direita cooptaram boa parcela da classe média que um dia foi progressista, pelo menos até o início desse século, e ampliaram o apoio do branco reaça antilulista representado pelos tios e pelas tias dos atos na Paulista.
Mas não conseguem alargar suas bases entre pobres, mulheres e jovens. Eles e elas resistem. E não há resistência ao fascismo que não dependa deles. Desde 1968, todos nós dependemos dos jovens. E hoje mais ainda.