
A Urihi Associação Yanomami levantou novas informações sobre o trágico acidente de helicóptero ocorrido em 7 de julho de 2025, por volta das 16h30, na região de Surucucu/Arathau, Terra Indígena Yanomami, no município de Alto Alegre (RR), que resultou na morte de dois pajés.
Os relatos das vítimas sobreviventes contradizem frontalmente a reportagem do G1, que reproduziu, sem buscar esclarecimentos com os parentes dos envolvidos, a versão oficial contida na nota de imprensa da empresa Voare Táxi Aéreo.
Em entrevista exclusiva ao DCM, lideranças da comunidade Yanomami relataram que o número de pessoas a bordo da aeronave não era de cinco passageiros, como alegado pela Voare em nota oficial, mas sim de 12 pessoas — cinco a mais do que a capacidade legalmente permitida no helicóptero Esquilo B2.
A bordo encontravam-se nove indígenas Yanomami, incluindo quatro crianças e três idosos (dois falecidos), um socorrista, um ajudante de helicóptero, além do piloto. Os pacientes estavam sendo transportados em missão de remoção médica, com suspeita de malária. O DCM teve acesso à lista de passageiros, cujos nomes não serão divulgados devido às intimidações e retaliações nos últimos dias.
Um dos sobreviventes relatou que “quando o helicóptero levantou voo, ele apagou de repente e buum”, precipitando-se em queda livre. De acordo com outros dois sobreviventes, o socorrista teria aberto a saída de emergência e retirado o piloto e o ajudante de helicóptero, enquanto dois Yanomami retiravam as quatro crianças e os três idosos doentes. Os dois pajés que vieram a falecer devido às queimaduras, segundo a vítima, foram “retirados do helicóptero com seus corpos em chamas”.
As lideranças Yanomami, por meio de seus advogados, dizem que irão buscar justiça para que a negligência da empresa Voare não seja ocultada nem passe impune.
A comunidade Yanomami encontra-se em luto pela perda de seus dois pajés, figuras centrais na medicina tradicional e na conexão espiritual de suas comunidades. A morte de um pajé não representa apenas a perda de um ancião, mas a ruptura de uma linhagem de saberes ancestrais que não são transmitidos por livros ou registros.
Segundo o relatório Yanomami sob Ataque, do Instituto Socioambiental (ISA), houve uma explosão do garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami durante o governo Bolsonaro, que provocou, por meio da destruição ambiental, uma crise sanitária sem precedentes, marcada por surtos de malária.
Em Palimiu, local de onde estavam sendo removidas as vítimas deste acidente por suspeita da doença, registraram-se mais de 1.800 casos em 2020, em uma população de pouco mais de 900 pessoas — quase dois episódios por habitante. O ISA destaca que a malária compromete não apenas a saúde, mas também a subsistência das famílias, impedindo atividades como caça e agricultura, e levando comunidades inteiras ao colapso.
Os órgãos públicos estimam que, durante a gestão Bolsonaro, 20 mil garimpeiros ilegais ocuparam postos de saúde, bases de proteção e pistas de pouso. A CIDH identificou que o governo brasileiro, sob Jair Bolsonaro, ignorou ao menos 21 alertas formais entre 2020 e 2022, enviados por órgãos como o MPF, a Funai e a SESAI, além de ter desobedecido ordens do STF (como a ADPF 709) e da Justiça Federal, que determinavam a expulsão dos invasores e a reativação da assistência médica.
A crise também inclui registros documentados de estupros de meninas indígenas, trabalho análogo à escravidão e tráfico de drogas vinculados ao garimpo. A Corte Interamericana, em decisão de julho de 2022, reconheceu que o Estado brasileiro violou os direitos à vida, à integridade física, à saúde e os direitos da criança, considerando que houve omissão deliberada e sabotagem institucional ativa por parte da Funai e de outros órgãos.
Em 2021, Jair Bolsonaro foi formalmente denunciado ao Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade cometidos contra os povos Yanomami, incluindo perseguição, negligência e omissão diante da emergência humanitária provocada por sua gestão.