STF suspende lei que permitia mercúrio e maquinário em garimpo no estado de Roraima

Atualizado em 28 de fevereiro de 2021 às 11:16
Garimpo sem estudo prévio e com uso de mercúrio e maquinário havia sido regulamentado pelo governador do estado de Roraima – Reprodução /Divulgação

Publicado originalmente no site Brasil de Fato

POR MARTHA RAQUEL

A Assembleia Legislativa de Roraima aprovou e sancionou neste ano de 2021 um projeto de lei que liberava o garimpo de todos os tipos de minérios no estado. A proposta foi feita pelo governador de Roraima, Antônio Denaruim (PSL). Por outro lado, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou, no último dia 19, a suspensão da medida.

A autorização permitia que o garimpo fosse realizado mesmo sem um estudo prévio e também englobava o uso de maquinário pesado na exploração da terra, escavadeiras e embarcações. O mercúrio, utilizado no garimpo do ouro para facilitar o processo de separação de partículas, também foi permitido pelo governo, mesmo sendo uma substância tóxica para a vida humana e para a natureza.

“A regulamentação desses aspectos se situa no âmbito de competência da União para a edição de normas gerais, considerada a predominância do interesse na uniformidade de tratamento da matéria em todo o território nacional, restando vedado aos Estados-membros, em linha de princípio, dissentir da sistemática de caráter geral definida pelo ente central (União)”, diz trecho da decisão.

Ministério Público Federal também enviou no início de fevereiro para a Procuradoria-Geral da República (PGR) uma representação com pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ao Supremo Tribunal Federal (STF). O objetivo é suspender imediatamente os efeitos da Lei Estadual nº 1.453/2031, que legisla sobre a exploração do garimpo em Roraima.

De acordo com a representação, a lei estadual invade a esfera de competência legislativa da União Federal, contrariando as normas gerais sobre licenciamento ambiental em jazidas, minas e outros recursos minerais, além de desconsiderar os prováveis impactos socioambientais decorrentes das atividades de lavra garimpeira no estado, em especial sobre as terras indígenas.

Em nota, a Secretaria de Comunicação do Governo de Roraima informou que “o licenciamento concedido na Lei é apenas o licenciamento ambiental em áreas estaduais, o que é competência do Estado, não estando inseridas áreas federais ou indígenas”.

Essa tem sido uma estratégia para que o lobby da mineração avance no país, garante Francisco Kelvim, coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens  (MAB).

Para Kelvim, formalizar essa atividade e criar uma legislação com normas para que ela aconteça, é forjar uma normalidade em uma prática prejudicial em todos os níveis. Ele cita que a liberação do garimpo em Roraima e em Rondônia está ligada ao Governo Bolsonaro. A estratégia vem sendo a flexibilização das legislações ambientais estaduais e a mudança dos zoneamentos ecológicos dos estados como Rondônia, Roraima, Pará e Acre.

Segundo o governo estadual de Roraima, “a proposta legislativa aprovada não regula diretamente a atividade de mineração ou garimpagem, mas trata de procedimentos administrativos para a concessão de licenciamento pelos órgãos ambientais para a exploração dessas atividades. O Poder Executivo, por meio da Fundação Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – Femarh/RR tem a competência de expedir licenças ambientais, no território do Estado de Roraima”.

Ivo Cípio Aureliano, indígena Macuxi e assessor jurídico do Conselho Indígena de Roraima (CIR) explica que hoje o garimpo é umas das maiores ameaças às comunidades indígenas no Estado.

“Todos os garimpos existentes em Roraima são ilegais e estão localizados dentro das terras indígenas. A promessa de legalização dessa atividade por parte do Governo Bolsonaro, por meio do Projeto de Lei 191/2021, que está no Congresso Nacional, estimulou as invasões e aumentou a cooptação de indígenas, causando vários tipos de violências”.

O CIR também está tentando reverter a situação no estado. “O CIR já encaminhou várias denúncias aos órgãos competentes (MPF, Polícia Federal, Exército, FUNAI, IBAMA), inclusive protocolou documento (Carta da Assembleia de 2019) no Ministério da Justiça em 2019 e entregou uma cópia do documento à Ministra Damares Alves, mas até o momento não tivemos nenhuma resposta sobre as ações que foram adotadas para combater o garimpo”, explica Aureliano.

Senador de Roraima e pedra apreendida

A Polícia Federal apreendeu na casa do senador Chico Rodrigues (DEM-RR) uma pedra que suspeita ser uma pepita de ouro durante uma operação sobre supostos desvios na Saúde, em outubro de 2020. Na mesma ocasião, o senador foi flagrado com R$ 33 mil na cueca.

A informação sobre a apreensão da pedra consta do relatório da ação, enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em nota, a defesa do Senador, na época, disse que “todos os bens e valores do Senador têm origem lícita, de forma que inexiste razão para a perseguição da qual ele é vítima”.

“Tendo em vista que o estado de Roraima possui um número elevado de garimpos ilegais e ouro e que o material encontrado possui um brilho dourado, é possível que esta teria/se trate de uma pedra com vestígios de ouro, o que, por si só, já restaria configurado crime de usurpação de bem da União. Portanto, sugere-se a apreensão”, escreveu a PF.

A Polícia Federal também apreendeu armas, munições avulsas e duas caixas de munições de espingarda calibres 20 e 36. Chico Rodrigues atuava como vice-líder do governo de Jair Bolsonaro no Senado desde o início de 2019. Após a repercussão da investigação, deixou o posto em 15 de outubro e na semana seguinte, em 20 de outubro, pediu afastamento do mandato.