
O Superior Tribunal Militar (STM) decidiu, por unanimidade, abrir ação penal contra o coronel da reserva Rubens Pierrotti Júnior, revertendo a decisão de um juiz de primeira instância que havia rejeitado a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), conforme informações da coluna Brasília Hoje, da Folha de S.Paulo.
O oficial é acusado de fazer críticas públicas à cúpula do Exército e à própria Justiça Militar, o que teria configurado crimes de “crítica indevida” e “ofensa às Forças Armadas”.
Pierrotti virou alvo da investigação após conceder entrevistas sobre o livro “Diários da Caserna: Dossiê Smart — A História que o Exército Quer Riscar”, no qual denuncia supostos casos de corrupção envolvendo oficiais do Exército, entre eles Hamilton Mourão, ex-vice-presidente e atual senador (Republicanos-RS).
Nas declarações, o coronel criticou o comportamento da instituição durante a tentativa de golpe de Estado liderada por Jair Bolsonaro (PL), afirmando que o movimento fracassou por “inépcia dos próprios militares”.
“Enxergo a atitude do comandante do Exército, do Alto Comando do Exército como uma atitude oportunista, muito mais do que o que está se vendendo como legalista”, disse Pierrotti, em um dos trechos destacados na denúncia.
O militar da reserva também afirmou que o Exército se tornou uma “unidade politizada” e criticou o STM por gastar muito e produzir pouco.

Ministério Público Militar recorreu da decisão inicial
O Ministério Público Militar sustentou que Pierrotti deveria responder pelos crimes de crítica pública a superior hierárquico e propagação de fatos inverídicos, alegando que suas falas “ofenderam a dignidade e abalaram o crédito das Forças Armadas”.
Na primeira instância, o juiz responsável rejeitou a denúncia, entendendo que o coronel estava na reserva e, portanto, não estava sujeito às restrições disciplinares da ativa. A decisão baseou-se em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que reconhece o “exercício regular do direito à crítica”, garantido pela liberdade de expressão.
“Não alcançando as ações o status material de delito, inviável torna-se a possibilidade jurídica da demanda para o exercício da Ação Penal Militar”, afirmou o magistrado na decisão.
O MPM, contudo, recorreu ao STM, que reverteu o entendimento por 14 votos a zero. A única a não votar foi a ministra Maria Elizabeth Rocha, presidente da Corte.
O advogado de Pierrotti, André Perecmanis, informou que irá recorrer. “Considerando que o entendimento do Superior Tribunal Militar contrariou a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal sobre o tema — como reconhecido até mesmo no parecer que o Subprocurador-Geral de Justiça Militar apresentou —, impetraremos em breve um habeas corpus com o objetivo de restabelecer a decisão que havia rejeitado liminarmente a acusação formulada contra o coronel Rubens Pierrotti”, afirmou.
Livro detalha denúncias de corrupção
A obra de Pierrotti foi escrita no formato “roman à clef” — gênero literário em que nomes são trocados para narrar histórias reais sob a aparência de ficção. Com mais de 500 páginas, o livro relata supostas irregularidades na compra de um simulador de apoio de fogo da empresa espanhola Tecnobit, que custou €13,98 milhões (R$ 32 milhões à época e cerca de R$ 83 milhões em valores atuais).
O coronel acusa oficiais de terem compactuado com práticas de corrupção na aquisição do equipamento. O Exército e Hamilton Mourão negam qualquer irregularidade e afirmam que o contrato gerou economia para a instituição.
O Ministério Público Militar arquivou as denúncias, e o Tribunal de Contas da União (TCU), mesmo após três anos de investigação, também encerrou o caso em 2021, apesar de a área técnica ter apontado irregularidades no processo.
