SUS tem rombo de R$ 449 milhões com acidentes e fim do DPVAT, comemorado por bolsonaristas, agrava situação

Atualizado em 27 de julho de 2025 às 15:14
Samu atendendo vítima de acidente de moto. Foto: reprodução

O Sistema Único de Saúde (SUS) destinou R$ 449 milhões em 2024 para o atendimento de vítimas de acidentes de trânsito no Brasil, segundo levantamento inédito do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com base em dados do Datasus. O valor, que poderia financiar a compra de 1.320 ambulâncias do SAMU (cerca de 50 por estado), representa um aumento de quase 50% nos gastos hospitalares com esse tipo de ocorrência desde 1998.

Os especialistas alertam para um cenário de dupla pressão sobre o sistema público de saúde: enquanto os custos com atendimentos crescem, o SUS deixou de receber R$ 580 milhões anuais com a extinção do DPVAT em 2024, medida articulada e comemorada pela bancada bolsonarista.

O seguro, que destinava 45% de sua arrecadação ao custeio médico-hospitalar de vítimas de trânsito, foi suspenso sob a justificativa de combate a fraudes e redução de custos regulatórios. “Derrubamos o DPVAT. PT Triste, Brasil Feliz”, escreveu Nikolas Ferreira (PL-MG) em dezembro do ano passado.

Nikolas Ferreira comemorou o fim do DPVAT. Foto: reprodução

“Estamos gastando para reparar os danos da insegurança, em vez de investir na prevenção e garantir que vidas não sejam perdidas por essa causa”, afirmou ao G1 Ricardo Pérez-Núñez, assessor regional em segurança viária da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Segundo a entidade, os acidentes de trânsito consomem entre 1% e 3% do PIB brasileiro – o equivalente a R$ 117 bilhões a R$ 351 bilhões por ano.

O problema se agravou com o fracasso da tentativa de recriar o seguro obrigatório em 2024. O governo federal propôs o SPVAT (Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito), mas voltou atrás diante da pressão política.

Victor Pavarino, oficial técnico em segurança viária da OPAS/OMS, critica o modelo de mobilidade adotado no país: “Os países criaram a terra fértil para o modelo individual, em detrimento do coletivo, mas não se prepararam devidamente para isso. É um modelo de mobilidade que gera colapso, tanto do ponto de vista da segurança quanto da eficácia. O resultado é um sistema caro, ineficaz e perigoso”.

Os dados revelam que:

– Entre 2011 e 2020, o SUS recebeu R$ 5,8 bilhões em repasses do DPVAT
– Em 2024, os gastos com internações por acidentes chegaram a R$ 449,8 milhões
– O uso adequado de capacetes poderia reduzir em 72% os traumatismos graves
– A fiscalização aumentou, mas a aplicação de punições efetivas diminuiu

O acidente na BR-116 em Teófilo Otoni, que deixou 41 mortos em dezembro de 2024, trouxe à tona as consequências da extinção do seguro obrigatório. Especialistas alertam que, sem o DPVAT, as vítimas dependem agora de seguros privados dos veículos envolvidos para obter indenizações.

“O investimento na prevenção sempre é menor do que o estrago que você tem, do impacto que você tem em várias dimensões — não só de saúde, mas previdenciária”, reflete Pavarino. “Você pegou o pai de família, que era o sustento da família ali — ele deixa de ser um provedor e passa a ser um custo, e um custo alto”.