
O Influenciador educacional Edcley de Souza Teixeira teria utilizado conteúdos sigilosos de pré-testes aplicados pelo INEP para elaborar questões, “prever temas” da prova do Enem e comercializar uma mentoria de alto preço para estudantes.
Teixeira é professor de cursinho pré-vestibular e estudante de medicina na Universidade Federal do Ceará (UFC),
O caso ganhou força nas redes sociais após usuários apontarem que Edcley divulgou, ao longo do ano, questões virtualmente idênticas — em valores, estrutura e enunciado — às aplicadas no 2º dia do ENEM 2024, gerando suspeitas de que ele estaria se beneficiando de acesso privilegiado a material que deveria ser protegido por sigilo institucional.
A live mais recente do influenciador, em que comparou “previsões” com as questões oficiais, reuniu mais de 41 mil pessoas, enquanto outros relatos dão conta de alunos de sua mentoria gabaritando a prova de Humanas com base nas supostas “apostas”.
Como funciona o pré-teste do INEP (e onde está a brecha)
Todo ano, o INEP aplica provas experimentais para avaliar e calibrar itens que podem ou não integrar futuras edições do ENEM. Elas são conhecidas como pré-testes, pré-banco de itens ou testes experimentais. Nesses testes, estudantes selecionados respondem a questões que ainda não existem oficialmente no exame, mas que podem aparecer anos depois — exatamente como denunciado por usuários que acompanharam Edcley.
A CAPES, por sua vez, realiza iniciativas como o Prêmio CAPES Talento Universitário, que envolvem avaliações padronizadas mas não integram o ENEM. Entretanto, desde 2022, a CAPES e o INEP passaram a cooperar em iniciativas de avaliação educacional, o que gerou confusão entre participantes e favoreceu a narrativa de alguns mentores que misturam informações oficiais com marketing próprio.
O ponto central é outro: participantes de pré-testes do INEP — inclusive estudantes de medicina, como Edcley — assinam termos de confidencialidade rigorosos. Nada do que é visto nessas provas pode ser reproduzido, comentado ou reaplicado.
Se, a partir dessas provas, alguém cria simulados “muito semelhantes” ou até “idênticos” aos aplicados pelo INEP posteriormente, isso constitui quebra de sigilo, uso indevido de informação restrita e possível vantagem indevida.
Mentoria com conteúdo sigiloso? Relatos de alunos apontam irregularidades
Ex-alunos de Edcley relatam que a mentoria se baseava quase exclusivamente na elaboração de simulados de “autoria própria” — mas extremamente parecidos com os itens de pré-teste.
A denúncia reacende o trauma do vazamento do ENEM em 2011, quando o professor Jahilton José Motta, do Colégio Christus, foi condenado por reproduzir 14 questões vistas em pré-testes da Cesgranrio e aplicadas a seus alunos antes da prova oficial.
O caso levou à substituição parcial do ENEM, prejuízo a milhões de estudantes e um duro golpe na imagem do exame. Em ambos, o dano mais grave é o mesmo: quebrar o princípio de isonomia, que sustenta qualquer exame nacional.

O risco para o ENEM: anulação, judicialização e falhas de segurança do INEP
A dúvida que paira na comunidade estudantil é imediata:o ENEM pode ser anulado?
Especialistas afirmam que ainda é cedo para afirmar, mas, se houver comprovação de que itens usados no exame foram expostos por alguém que participou do pré-teste; se houver monetização desse acesso e se houver alunos beneficiados — especialmente após lives públicas, então o INEP deverá responder a contestações administrativas e judiciais.
Se confirmado o vazamento e suposta fraude, o Instituto também precisará explicar como permitiu que participantes de pré-teste reutilizassem itens em produtos comerciais; por que seu sistema de sigilo não impediu a reprodução de itens não autorizados; e existe controle efetivo sobre quem participa do pré-teste e quais medidas serão tomadas para garantir a integridade dos bancos de itens futuros.
Ambiente de suspeita: buscas por “tema da redação” na madrugada e lives com questões idênticas
Outro elemento que agrava a crise foi a descoberta de que, na madrugada anterior ao 2º dia de prova, havia alto volume de buscas no Google sobre o tema da redação, o que reacendeu suspeitas de vazamento prévio.
Somado a isso, uma live de seis dias antes da prova, apontada por usuários, teria apresentado questões idênticas às do ENEM oficial — “mesmos números, mesmo enunciado, mesma lógica”.
Para muitos estudantes, isso reforça a sensação de que existe uma indústria paralela de acesso privilegiado aos bastidores do exame.
Não se trata de “previsão”, mas de responsabilidade pública
A tentativa de transformar material sigiloso em “conteúdo exclusivo” para mentoria não apenas viola princípios éticos, mas pode constituir quebra de sigilo, vantagem indevida, enriquecimento ilícito e dano coletivo a milhões de estudantes que confiaram no exame.
Deve-se instaurar uma investigação formal do INEP, além de auditoria independente do banco de itens, com eventual responsabilização de envolvidos, além de profunda revisão dos protocolos de pré-teste para restauração da confiança pública.




