Tentaram me calar em sala de aula e agora tentam me calar no debate público. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 4 de outubro de 2019 às 11:37

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POR LUIS FELIPE MIGUEL

O grupo de professores ultradireitistas que se abriga sob a alcunha mentirosa de “Docentes pela Liberdade” está alardeando que tem “um exército de advogados” e vai processar todos aqueles que os criticarem. É uma clara tentativa de intimidação, com o objetivo de cercear o debate. Mostra bem qual é o projeto que os anima.

Posso testemunhar que eles estão passando da bravata à prática. Recebi a visita de um oficial de justiça – um rapaz muito gentil, muito bem educado – que me apresentou uma intimação. Na verdade, não é uma queixa-crime, só uma interpelação, um pedido de “esclarecimentos”, que posso ou não atender.

O documento chega a ser patético. O alvo é uma postagem minha, velha já de meses, em que falo de “um elitista agressivo, que se tornou folclórico no campus”. O professor quer saber se é dele mesmo que eu estava falando.

Aproveita e pede explicações sobre meus posicionamentos políticos. Por exemplo, quer que eu justifique por que digo que o governo Bolsonaro tem “uma catinga fascista”. Não podia ser mais evidente o caráter autoritário da investida, seu desejo de calar as críticas, seu ataque à liberdade de expressão política.

Por mais inane que seja a investida judicial, ela causa incômodo à sua vitima. Tenho que parar meu trabalho, tenho que definir minha resposta. Perco tempo. Eventualmente, terei que contratar um advogado.

Não é uma questão que atinja só a mim, pessoalmente, e aos outros colegas que são ou serão alvos do grupo. É um assédio à nossa liberdade de expressão como categoria, como profissionais da educação. Creio que nossas associações representativas – a ADUnB, aqui na UnB; o ANDES, nacionalmente – devem responder institucionalmente e devem montar uma rede de proteção aos professores.

Não sei quem financia os docentes pelo autoritarismo, quem paga o “exército” que eles dizem ter a seu dispor. Eles dizem que os reforços estão sendo enviados por Deus em pessoa, mas eu me permito duvidar dessa afirmação. As organizações da extrema-direita latinoamericana costumam receber dinheiro mais terreno, de fundações estadunidenses.

Mas o objetivo é evidente: atrapalhar os professores com processos que, mesmo sem sentido, perturbam sua rotina pessoal e profissional – e assim estimulá-los ao silêncio. É uma forma de litigação de má fé.

Quanto a mim, tentaram me calar em sala de aula e agora tentam me calar no debate público extramuros. Mas não tenho a menor intenção de me deixar intimidar. Enquanto não chega o Estado policial com o qual eles sonham, não vou deixar de exercer minha capacidade de crítica em todos os espaços a que tiver acesso.

(Para os reacinhas que bisbilhotam sistematicamente essa minha página, um recado: não precisam mobilizar um oficial de justiça para indagar qual é “o Estado policial com que sonham”. Minha resposta já está aqui: vocês sabem muito bem!)