Timóteo, Brizola e Vargas. Por Fernando Brito

Atualizado em 4 de abril de 2021 às 0:22

Publicado originalmente no blog do autor

Por Fernando Brito

Jovem “foca”, em 1982, acompanhei a campanha de Brizola e, nela, o “capítulo” Agnaldo Timóteo, candidato a deputado federal pelo PDT, sob a desconfiança de muitos do partido, mas com a tolerância do ex-governador gaúcho às esquisitices do cantor.

E não era para menos. Não havia campanha na televisão – apenas os retratinhos fixos da “Lei Falcão” – e impôs-se o “voto vinculado” – regra que obrigava a que todos os candidatos – de vereador a governador – fossem do mesmo partido, do contrário seriam anulados. Neste quadro, a presença de Agnaldo Timóteo, espalhafatoso em seus ternos brancos com camisas vermelhas ou rosas, nos comícios era a garantia de que o povão iria lá para ouvi-lo cantar – “Quem é que não teve um grande amoooooor…” – e ouviria Brizola, Saturnino Braga, Darcy Ribeiro…

A mim, já militante político há alguns anos, ver a corrente de povão que chegava a ouvir o discurso de uma esquerda socialista era um espanto delicioso.

No final da campanha isso já não era decisivo, mas no início, quando Brizola lutava para sair dos 2% em que as pesquisas o cercavam, foi.

Anos depois, conversando sobre isso, Brizola lembrava uma história de Getúlio Vargas, em 46, diante dos protestos do sindicalista José Vecchio contra a inclusão de um sujeito algo suspeito na lista de candidatos do PTB no Rio Grande do Sul.

E contava que o velho Getúlio, depois de uma baforada no charuto, disse: “mas, Vecchio, vamos dizer que você tem razão e e este sujeito é um sem-vergonha. Mas os nossos sem vergonhas vão votar em quem, no nosso ou nos sem-vergonhas dos outros?”

Depois de eleito, durou muito pouco a convivência de Timóteo com Brizola. Uma exigência para que o Banco do Estado lhe fizesse um empréstimo para montar uma gravadora e para que Brizola empregasse duas dezenas de seus “cabos eleitorais” causaram o rompimento com estardalhaço. O episódio deu em uma grossa troca de ofensas entre ambos e no início de um pula-pula político partidário em que Timóteo jamais conseguiu recuperar a magnífica votação que teve em 1982: 503 mil votos.

Timóteo era um personagem imprevisível. Do PDT de Brizola foi para o PP de Maluf, não sem antes votar pelas diretas. Andou no PMDB, voltou para o PP e passou por uma dezena de partidos.

Nos últimos anos, manteve-se na contradição ambulante: apoiou Jair Bolsonaro, mas fazia a defesa feroz da inocência de Lula. Não era simpatia política, mas, talvez, a empatia entre o garoto pobre de Caratinga com o garoto pobre de Garanhuns, que abriram seus próprios caminhos entre pobreza e preconceitos.

Era difícil gostar do Timóteo político, mas também era impossível deixar de ver nele uma voz, ainda que desafinada como nunca foi ao cantar, brotada forte da garganta do Brasil popular do qual nossa elite tem horror.