TJ-RJ absolve 23 condenados por manifestações violentas contra a Copa de 2014

Atualizado em 19 de março de 2024 às 18:07
Manifestações violentas contra a Copa de 2014. Foto: Divulgação

Por Sérgio Rodas

Por reconhecer a ilicitude das provas que fundamentaram a acusação, a 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro anulou, nesta terça-feira (19/3), as condenações de 23 ativistas que participaram de manifestações contra a Copa do Mundo de 2014 no Brasil.

Em 2018, o juiz Flavio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do Rio, estipulou penas que variavam de 5 anos e 10 meses — para os que eram menores de idade à época — a 7 anos de reclusão aos réus. Conhecidos como black blocs, os ativistas foram acusados de planejar atos violentos com a justificativa de que as obras para o evento foram superfaturadas.

Em outro processo, Camila Aparecida Rodrigues Jourdan e seu ex-namorado Igor Pereira D’icarahy foram condenados a 6 anos de reclusão pela posse ilegal de artefatos explosivos. No cumprimento de mandado de prisão temporária de Camila (que no momento estava com D’icarahy), a polícia revistou o quarto dela e apreendeu um artefato explosivo de fabricação caseira, dois artefatos explosivos de plástico contendo líquido com odor de gasolina, uma caixa e um funil.

A 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ manteve a condenação, mas reduziu a pena. No julgamento, o desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, que ficou vencido, aceitou a preliminar da defesa e reconheceu a ilicitude da prova obtida na busca e apreensão e das dela derivadas. Com isso, votou por absolver os réus.

Com base no voto vencido, a defesa de Igor D’icarahy, comandada pelos advogados Luís Guilherme Vieira, Salo de Carvalho, Ademar Borges de Sousa Filho e Jefferson Gomes, apresentou embargos infringentes. Segundo eles, mandado de prisão temporária não permite que a polícia promova busca e apreensão em residência, salvo quando houver fundadas suspeitas da prática de crime em flagrante, conforme fixado pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 280 com repercussão geral.

“A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados”, entende o Supremo.

Camila Jourdan, professora de filosofia da Uerj. Foto: Reprodução

No caso, não existiam fundadas razões que fizessem a polícia suspeitar de situação de flagrante delito para justificar busca e apreensão, alegaram os advogados. Afinal, a polícia decidiu revistar um ambiente da casa Camila Jourdan por ela ter tentado fechar uma porta que estava aberta, aparentando, segundo os agentes, “querer ocultar algum material ilícito”.

Contudo, disse a defesa, não havia nenhum elemento que sugerisse a existência de situação de flagrante delito decorrente da posse de artefato explosivo. E não bastam meras suposições, suspeitas e conjecturas para legitimar as buscas, afirmaram os advogados, apontando que houve violação do domicílio da ré (artigo 5º, XI, da Constituição Federal).

A 5ª Câmara Criminal do TJ-RJ aceitou a tese da defesa sobre a ilicitude das provas e absolveu D’icarahy e Camila com base no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal (“não existir prova suficiente para a condenação”).

A pedido da defesa, a 5ª Câmara Criminal do TJ-RJ, em nova decisão, ordenou o desentranhamento e inutilização das provas derivadas da busca e apreensão sem mandado judicial feita por policiais na casa de Camila Jourdan de processos contra ela e Igor D’icarahy.

Decisão de Gilmar

Porém, as provas continuaram no processo, mesmo com decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal ordenando o desentranhamento. Como o julgamento das apelações, pela 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ tinha sido marcado para esta terça, a defesa de Igor D’icarahy recorreu novamente ao STF.

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, determinou, neste domingo (17/3), ao desembargador Sidney Rosa da Silva que desentranhasse as provas declaradas ilícitas no prazo de 12 horas, proibindo o início da sessão de julgamento das apelações com as provas nos autos.

O magistrado mencionou que, na sessão da 2ª Turma de 2021, já havia dito que era “abusiva a postergação da análise do pedido para a sessão de julgamento da apelação, na medida em que tal procedimento esvazia, por completo, a declaração de ilicitude da prova implementada pela 5ª Câmara”.

Ministro Gilmar Mendes. Foto: Divulgação

Na sessão desta terça, a 7ª Câmara Criminal do TJ-RJ reconheceu a ilicitude das provas, apontada pela defesa de Igor D’icarahy, aceitou as apelações dos réus e anulou as condenações.

A defesa de Igor D’icarahy afirmou à revista eletrônica Consultor Jurídico que as absolvições reafirmam o direito fundamental da inviolabilidade do domicílio.

De acordo com os advogados, “buscas e apreensões têm de se dar nos estritos limites da ordem judicial, não podendo os policiais executores, sem mandado judicial, e sem qualquer fundamento concreto antecedente ao início da diligência, sair vasculhando cômodos da casa, objetivando encontrar algo que possa ser ilícito”.

A defesa de Filipe Proença, Felipe Frieb e Pedro Guilherme Mascarenhas foi conduzida por Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Roberta Cristina Ribeiro de Castro Queiroz, Marcelo Turbay Freiria, Liliane de Carvalho Gabriel, Álvaro Guilherme de Oliveira Chaves e Ananda França de Almeida, todos do Almeida Castro, Castro e Turbay Advogados Associados.

Eles disseram que “a liberdade de expressão e de manifestação são pilares do Estado democrático de Direito e devem ser resguardadas, nos termos da Constituição Federal”.

Originalmente publicado no ConJur
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