
Um estudo recente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco) revelou uma situação desigual no sistema tributário brasileiro: trabalhadores que recebem acima de R$ 6 mil por mês pagam mais Imposto de Renda do que milionários. A pesquisa, com base nos dados do Imposto de Renda de 2024 (ano-calendário 2023), expõe um cenário de crescente desigualdade na tributação, onde as alíquotas efetivas dos milionários são muito menores que as dos trabalhadores de faixas salariais médias e baixas.
De acordo com o estudo, os milionários brasileiros pagaram, em média, uma alíquota efetiva de apenas 5,28%, sendo essa taxa superior apenas à dos trabalhadores que recebem entre 1 e 5 salários mínimos, ou seja, entre R$ 1.320 e R$ 6.600. Nesse grupo, as alíquotas efetivas variaram entre 0,61% e 3,59%. No entanto, a situação é bem mais grave para os trabalhadores situados no “meio da pirâmide” salarial.
Os trabalhadores que recebem entre 5 e 7 salários mínimos, ou de R$ 6.600 a R$ 9.240, enfrentaram uma alíquota efetiva de 6,63%, ainda acima das alíquotas dos milionários.
Para quem recebe entre 15 e 20 salários mínimos (R$ 19.800 a R$ 26.400), a taxa de tributação chega a 11,40%, mais de duas vezes superior àquela paga pelos mais ricos. Esses dados refletem uma distorção no sistema tributário que prejudica especialmente as faixas de renda intermediária e baixa.
O Sindifisco também observa uma relação crescente entre a renda total declarada e a parte isenta de tributação, o que significa que quanto mais alta a renda, maior a fatia da renda isenta de impostos. Para os brasileiros que ganham mais de 240 salários mínimos por mês (R$ 316.800), aproximadamente 71% de seus rendimentos são isentos e não tributáveis.

Em contrapartida, nas faixas de renda mais baixas, a isenção representa uma proporção muito pequena da renda, com alguns casos em que apenas 5% da renda é isenta.
Outro ponto crítico apontado pelo estudo é o aumento da participação dos lucros e dividendos na composição da renda dos brasileiros. Esses rendimentos são isentos de tributação, o que tem gerado uma distorção no sistema.
Dados do estudo indicam que, em 2024, cerca de 35% da renda total declarada no Imposto de Renda corresponde a rendimentos isentos e não tributáveis, sendo que 35% dessa parcela vem de lucros e dividendos. Em termos absolutos, isso representa mais de R$ 700 bilhões em rendimentos isentos, um aumento de cerca de 14% em relação ao ano anterior.
Dão Real Pereira dos Santos, presidente do Sindifisco, destaca que a isenção de lucros e dividendos tem incentivado a “pejotização”, processo pelo qual trabalhadores se tornam pessoas jurídicas para receber lucros isentos, em vez de salários tributados. Santos afirma que esse tipo de planejamento tributário favorece os mais ricos e onera os trabalhadores de rendas mais baixas.
“Vemos cada vez mais um planejamento tributário que amplia as rendas isentas e onera as rendas mais baixas”, comentou em entrevista ao G1.
Em relação à reforma tributária, aprovada em 2023, a expectativa é que as mudanças entrem em vigor de forma completa apenas em 2033. O projeto, que trata principalmente da cobrança de impostos sobre o consumo, já passou por algumas etapas, mas a parte mais crítica, que envolve a tributação sobre a renda, ainda está sendo discutida.
Uma das propostas em discussão é a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Segundo Santos, essa reforma busca reverter a tendência de cobrar alíquotas mais altas sobre as rendas baixas do que sobre as mais altas. “Esse projeto do governo deve desonerar quem ganha até R$ 5 mil, mas isso ainda é uma correção parcial do problema”, avaliou.
O presidente do Sindifisco acredita que o caminho ideal seria revogar a isenção de lucros e dividendos e corrigir a tabela do Imposto de Renda, o que poderia reduzir a carga tributária sobre os trabalhadores e até diminuir a alíquota sobre o consumo.