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A tragédia dos comuns, o golpe, a fome e o ideário nazista de nossos atuais governantes. Por Carlos Fernandes

Num longo artigo publicado em 1968, o biólogo americano Garret Hardin formulou uma teoria que viria a chamar de Tragédia dos comuns.

Em termos gerais, a teoria de Hardin determina que a impossibilidade de controlar os excessos individuais dos participantes de um determinado grupo, leva à completa destruição do seu meio uma vez que na ânsia de se sair melhor num ambiente de livre acesso, cada indivíduo procura tomar para si a maior quantidade de recursos disponíveis possíveis.

Ainda que coletivamente todos queiram a preservação do seu meio, a ação famigerada das partes conduz invariavelmente à tragédia temida por todos.

Garret Hardin me veio à cabeça por dois motivos.

Um por ter sido um fervoroso adepto da teoria Malthusiana, aquela do economista inglês Thomas Robert Malthus para quem o crescimento populacional se dá em progressão geométrica enquanto que o crescimento da produção de alimentos em progressão aritmética.

Evidentemente que a teoria de Malthus jamais se comprovou, mas como em 2017 o Brasil voltou a ocupar um vergonhoso lugar de destaque no mapa da fome da ONU, o tema veio a calhar para o que segue mais à frente.

O segundo motivo para citar a Tragédia dos comuns de Garret Hardin é o fato de ainda que sua teoria tenha sido formulada para tentar explicar alguns fenômenos naturais de ondem ambiental, poderia facilmente ser aplicada ao resultado obtido pelo golpe jurídico-parlamentar-midiático sofrido pelo país em 2016.

Ferida de morte a democracia, a quadrilha que tomou de assalto o poder não economizou nos ataques às conquistas sociais e ao patrimônio público na ânsia em que cada golpista se declarou no direito de arrebanhar para si a maior quantidade de lucro possível da surtida.

O resultado, pouco mais de um ano após a ascensão esdrúxula de Temer à presidência da República, não poderia ser descrito de outra forma senão como uma completa devastação do meio político, econômico, social e institucional do Brasil. Uma tragédia propriamente dita.

Pois bem, ambientado o querido leitor, chego até aqui porque neste domingo (15), o Brasil será palco mais uma vez após exatos 10 anos, de uma novamente necessária Campanha Natal Sem Fome, a iniciativa criada pela ONG Ação da Cidadania fundada em 1993 por Herbert José de Sousa, o Betinho.

Após mais de uma década de esforços concentrados na luta contra a erradicação da fome no Brasil, o país sucumbe nas mãos de irresponsáveis que geraram para o seu povo, em última instância, a pior de todas as degradações do ser humano: a falta de um mísero prato de comida com que uma mãe possa alimentar os seus filhos.

Curiosamente, também em 2017 completou outros exatos 20 anos da morte de Herbert. Não deixa de ser um certo alívio que nosso querido e humano Betinho não esteja mais entre nós para constatar que o seu sonho de um Brasil sem fome foi jogado à lama pelo que de pior pôde ser produzido no cenário político brasileiro.

Ainda mais quando o que surge como um seu pretenso paralelo nos tenebrosos tempos que vivemos, é um imoral insensível como João Dória Júnior que acredita piamente contribuir com a construção da dignidade humana ao servir uma ração à base de restos insalubres de alimentos em putrefação aos pobres.

Bastasse, em troca de sua ração, obrigar a trabalhos forçados os milhões de excluídos gerados pelo golpe que tão felizmente ajudou a implantar, e estaria, escarrada e esculpida, a prática escravocrata adotada pelo regime nazista de Adolf Hitler.

Como se vê, para que a fome no Brasil fosse reintegrada como uma poderosa política de manutenção dos velhos coronéis da República, não precisou de nenhuma maneira que a teoria populacional de Malthus se cumprisse.

Em contrapartida, a Tragédia dos comuns de Garret Hardin aplicada em boa medida para explicar a escassez de recursos naturais pelo uso e/ou consumo desenfreado de indivíduos sedentos de amealharem o máximo para si em detrimento do coletivo, cai como uma luva para explicar a situação política, econômica e social do país.

Pela ganância, voracidade, desrespeito, insensibilidade, incompetência e falta de planejamento de uns poucos privilegiados, a fome, a crua e dolorosa fome, volta a nos afligir.

Carlos Fernandes

Economista com MBA na PUC-Rio, Carlos Fernandes trabalha na direção geral de uma das maiores instituições financeiras da América Latina

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