Trama golpista: advogados de investigados entram em rota de colisão com defesa de Bolsonaro

Atualizado em 4 de dezembro de 2024 às 7:24
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): a declaração da defesa do ex-capitão incomodou os advogados dos demais investigados. Foto: reprodução

A defesa de militares investigados por envolvimento em um suposto plano golpista entrou em conflito com a estratégia jurídica do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), cuja tese sustenta que ele não seria o principal beneficiário do esquema, mas sim uma “junta militar”, caso as investigações se confirmem. Com informações do Globo.

Bolsonaro e outras 36 pessoas, incluindo 24 militares, foram indiciados pela Polícia Federal (PF) por crimes como abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e organização criminosa.

O advogado de Bolsonaro, Paulo Bueno, argumentou que, de acordo com as investigações, o ex-capitão não ocuparia nenhuma posição no gabinete de crise que seria formado após a execução do plano golpista, conhecido como “Punhal Verde e Amarelo”.

“Quem seria o grande beneficiado? Segundo o plano do general Mário Fernandes, seria uma junta que seria criada após a ação do Plano Punhal Verde e Amarelo, e nessa junta não estava incluído o presidente Bolsonaro”, declarou Bueno em entrevista à GloboNews.

“Não tem o nome dele lá, ele não seria beneficiado disso. Não é uma elucubração da minha parte. Isso está textualizado ali. Quem iria assumir o governo em dando certo esse plano terrível, que nem na Venezuela chegaria a acontecer, não seria o Bolsonaro, seria aquele grupo.”

O incômodo dos advogados

As declarações incomodaram os advogados dos militares investigados, que interpretaram a fala como uma tentativa do ex-chefe do Executivo de transferir a responsabilidade pelo plano aos militares de seu entorno.

O advogado Marcus Vinicius Figueiredo, que representa o ex-secretário-executivo da Secretaria Geral da Presidência, Mario Fernandes, rebateu as declarações. “A colocação dele é irresponsável. Ele é advogado de defesa ou promotor? Está atuando como promotor. Como faz isso? Me causa perplexidade”, criticou Figueiredo.

Preso preventivamente há duas semanas, o general Mário Fernandes é apontado pela PF como o mentor do plano que previa, entre outras ações, a morte do ministro Alexandre de Moraes, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do vice-presidente Geraldo Alckmin.

General da reserva Mario Fernandes e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): o militar foi preso há duas semanas em uma operação que investiga um plano para assassinar Lula. Foto: divulgação

De acordo com a PF, Fernandes também teria elaborado o texto que sugeria a criação de um “Gabinete Institucional de Gestão da Crise”, liderado pelo general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, e pelo general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa, além dele próprio.

Bolsonaro não é mencionado como integrante desse gabinete, mas a PF afirma que ele “planejou, atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva” sobre o esquema para permanecer no poder e impedir a posse de Lula.

Outro advogado de Fernandes, Raul Livino, adotou um tom conciliador ao comentar o conflito. “Ele [Paulo Bueno] agiu na função dele de defender o seu cliente. Ainda não temos linha de defesa fixa. Estou fazendo agora uma releitura de todo o conteúdo para definir a linha”, explicou Livino.

Além disso, advogados têm comparado a situação de Fernandes à do tenente-coronel Mauro Cid, cujas mensagens de celular e documentos impressos no Planalto também implicaram sua participação na trama. A tensão entre as defesas de Fernandes e de Bolsonaro se intensificou, levando um advogado próximo de ambos a intermediar uma conversa para resolver o impasse.

Segundo relatos, Paulo Bueno teria esclarecido que suas declarações eram hipotéticas, feitas “se os planos forem realmente confirmados pela Justiça”, e que não tinha a intenção de culpar os militares.

Enquanto isso, outros advogados ligados a militares e ex-assessores de Bolsonaro têm trabalhado para minimizar o papel de seus clientes no plano golpista. Eduardo Kuntz, defensor dos ex-auxiliares Marcelo Câmara e Tércio Arnaud, afirmou que ambos exerciam funções secundárias no governo e não estavam envolvidos em “discussões estratégicas”.

“O Tércio não é militar, o Câmara não é general. Eles não participavam de nenhum grupo ou setor específico de setores estratégicos. Eles são secundários, não tinham credencial para participar de uma conversa minimamente mais séria”, garantiu o advogado.