Por Caique Lima
A apelação de Ricardo Salles deve ser julgada no próximo dia 15 pela 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente do TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo). O ministro foi condenado em primeira instância por improbidade administrativa, acusado de fraudar plano de manejo para favorecer a FIESP enquanto secretário do Meio Ambiente de Alckmin.
A pena é de suspensão dos direitos políticos por três anos, pagamento de multa equivalente a dez vezes o valor de seu salário no cargo de secretário e proibição de contratar com o Poder Público por três anos.
O processo já foi distribuído pelos magistrados da turma recursal e o julgamento da apelação foi incluído na pauta do dia 15 de outubro.
Salles recorreu da decisão em 1ª instância em agosto de 2019 e os autos estão nas mãos do relator, o desembargador Nogueira Diefenthaler, e preparados para julgamento, desde janeiro de 2020.
Após a condenação, antes mesmo de assumir o cargo de ministro, Salles recorreu da decisão para impedir a execução da condenação até que fosse julgada a apelação. O relator aceitou, citando “eventuais danos de grave monta e de difícil reparação”.
O processo ficou parado por mais de 4 meses depois disso e seu andamento só voltou após um pedido de Alessandro Molon ao TJSP, em junho, para que houvesse celeridade no julgamento, alegando urgência e “extrema relevância para a condução nacional da pauta do meio ambiente”.
O julgamento já foi pautado anteriormente, em 3 de setembro, mas o desembargador aceitou uma petição da defesa do ministro, alegando que o julgamento que o condenou, em dezembro de 2018, foi apressado e que há “pressão midiática” contra ele, conforme mostrou a Crusoé.
Ministério Público pede que Salles seja retirado do cargo
Em parecer ao qual o DCM teve acesso, o MPSP (Ministério Público do Estado de São Paulo) pede que Salles seja condenado “à perda de função pública”, mesmo que a suposta ilegalidade tenha sido cometida em outro cargo.
O órgão se baseou em entendimento do STJ de que, com a Lei da Improbidade Administrativa (8429/1992), deve-se “extirpar da Administração Pública” o infrator em “qualquer atividade que o agente esteja exercendo ao tempo da condenação”. O tribunal entendeu que a improbidade não está ligada ao cargo, mas à atuação na administração pública.
O MPSP ainda argumenta que Salles atuou na suposta fraude do plano de manejo “com o único propósito de atender aos interesses econômicos da FIESP, em inegável afronta ao dever de proteção do meio ambiente”:
“A conduta desenvolvida pela FIESP, de que decorreram as sanções que lhe foram impostas, fora individualizadas, de forma satisfatória, naquela decisão, no sentido de ter levado a cabo, principalmente com o corréu – Ricardo de Aquino Salles -, as mudanças introduzidas no plano de manejo da APAVRT [Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê] para consagrar o indevido favorecimento dos interesses do setor produtivo, em franca afronta aos deveres constitucionais e legais de preservação ambiental”.
Salles só será retirado do cargo se o TJSP aceitar a “perda de função pública” do pedido do MP-SP
“A condenação por improbidade tem que se dar com a perda da função pública, não basta só ser condenado por improbidade. No caso do Salles, não houve essa condenação em primeira instância porque ele havia, em tese, já saído do cargo de secretário”, segundo Lucas Albuquerque Aguiar, que é advogado em Davi Tangerino e Salo de Carvalho Advogados. Mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Leiden, na Holanda, e conversou com o DCM.
Mesmo com o entendimento do STJ, Salles possivelmente não será retirado do cargo, ainda que condenado em segunda instância, pois o Art. 20 da Lei de Improbidade (8429/1992) prevê que “a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória”.
O advogado chama o artigo de “pegadinha”:
“Pelo próprio espírito da lei de improbidade, não faz sentido manter alguém no cargo, ainda que diferente, se a pessoa foi condenada por improbidade administrativa”.
O Art. 87 da Constituição Federal prevê que “Ministros de Estado serão escolhidos dentre brasileiros maiores de vinte e um anos e no exercício dos direitos políticos”.
Ainda que a restrição valha também para ministros já nomeados, o supracitado Art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa impede que Salles seja retirado do cargo:
“Ele só perderá os direitos políticos depois do trânsito em julgado, não basta só o Tribunal de Justiça confirmar. Se há recurso, os direitos políticos continuam valendo, se eles continuam valendo, não se aplica a restrição”, explica Lucas.
Salles seria considerado “ficha suja”, ou seja, sujeito a Lei da Ficha Limpa, se condenado em 2ª instância. Houve uma tentativa da Câmara dos Deputados de emplacar a PEC 11/11 que impediria a nomeação de ministros de Estado inelegíveis, mas a proposta não foi aprovada.
Por isso, se confirmada a sentença, Salles não seria retirado do cargo pela lei, somente não poderia sair do cargo para disputar novas eleições:
“Ele seria inelegível, mas não inominável. Como ele está num cargo que não é de eleição, é de nomeação, isso não afeta o exercício dele no Ministério do Meio Ambiente. Ele não vai poder sair para se candidatar, se confirmado”, esclarece o advogado.
Em 2019, Bolsonaro publicou um decreto aplicando critérios da Lei da Ficha Limpa para a nomeação de cargos em comissão, mas não inclui ministros de Estado, somente cargos DAS e FCPE.
Para Lucas, isso mostra como a situação de ministros é “sui generis”:
“É quase um cargo elegível, no sentido de importância do cenário da Administração, mas é um cargo de livre nomeação”.
“Essa coisa tem de ser resolvida num âmbito político, não no jurídico. Por essa via, por enquanto, é muito provável que não mude nada. Tudo indica para que o quadro não se altere”, completa.