Trump também era favorito. Por Emir Sader

Atualizado em 16 de fevereiro de 2021 às 10:29

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Donald Trump e Jair Bolsonaro

Por Emir Sader

Há um ano Trump era favorito para se reeleger presidente dos Estados Unidos. Reinava soberano no alto das pesquisas, enquanto seus adversários se digladiavam para saber que o enfrentaria, todos lá embaixo, divididos, com índices baixos para poder desafiar a Trump.

Situação parecida com a que vivemos agora, com Bolsonaro tendo liquidado seus adversários no campo da direita, com golpes duros e rápidos, deixou a nocaute a Doria, a Moro, a ACM Neto e a outros frágeis pretendentes a disputar com ele a preferencia do grande empresariado, da mídia e dos partidos de direita, que hoje, mais divididos ainda, lambem as feridas, resignados.
Enquanto isso o Judiciário, prestando mais um serviço às oligarquias deste país, tarda para julgar Lula e devolver-lhe os direitos plenos, para que ele possa ser o candidato que unifique a oposição contra o Bolsonaro. As pesquisas então indicam Bolsonaro lá em cima e uma quantidade de candidatos da oposição dividindo entre si as preferências, todos com enormes dificuldades para unificar-se e canalizar o grande potencial de rejeição ao Bolsonaro.
As pesquisas, por menor que sejam suas mostras – frequentemente entrevistando a mil pessoas no Brasil todo – vão fixando na cabeça das pessoas supostas situações inevitáveis. Ninguém pensa que se Lula estivesse, talvez reproduzisse a situação de 2018, em que todas as pesquisas indicavam que ele venceria a todos os adversários no primeiro turno.
Tampouco levando em conta que a pesquisa, além de limitada no numero de entrevistas, são feitas por telefone, numa situação muito fria e artificial, além de deixar grande parte da população mais pobre fora da consulta. Mas, principalmente, não leva em conta que pesquisa é uma coisa, campanha é outra. O que conta especialmente para o Lula, por sua extraordinária capacidade de comunicação, especialmente com as grandes maiorias pobres do pais, seja como candidato, seja apoiando um candidato – o que faltou ao Haddad em 2018.
Bolsonaro não teve sequer a lua-de-mel de Trump, com a economia norte-americana crescendo, gerando empregos – o que costuma produzir sempre reeleição de um presidente nos EUA. A pandemia virou o país de cabeça pra baixo, a começar pela economia, que entrou em recessão, gerando desemprego. Ao mesmo tempo, o discurso negacionista em relação à pandemia gerou um clima muito desfavorável à reeleição.
Os democratas, por sua vez, se reunificaram em torno de um candidato moderado, que pôde contar, desde o começo, com setores do próprio Partido Republicano, descontentes com as posições de Trump. Mas, sobretudo, canalizou todas as formas de rejeição a Trump, prometendo um governo de reativação da economia e de combate firme à pandemia, contrapondo-se fortemente ao cenário que representava Trump.
Outro aspecto negativo das pesquisas sem Lula, é que alimentam os outros candidatos da oposição a acreditar que podem ser eles o candidato da esquerda contra o Bolsonaro. Ficou claro, primeiro, que a disputa vai ser duríssima, não é qualquer nome que pode encará-la. Segundo, que Bolsonaro terá um forte caudal de apoio, ao qual é preciso contrapor um apoio forte apoio popular, como o que os candidatos do PT sempre tiveram, enraizados no nordeste, mas agora também nas periferias das grandes cidades do sudeste e do sul. Um parada que só o Lula, candidato ou apoiador de uma candidatura, pode encarar.
Será indispensável também, como se pode aprender das experiências boliviana e equatoriana, uma vitória por ampla margem, para superar os processos de judicialização que se impuseram naqueles países e aqui também, e sob os quais se dão as eleições nesses países. A saída desse processo requer unidade das forcas democráticas, forte apoio popular e uma grande liderança, que passe segurança da capacidade de derrotar a Bolsonaro e governar com sucesso – como o PT conseguiu fazer.
Bolsonaro pode estar favorito, mas não será favorito, se a esquerda se orientar pelos critérios das experiências das recentes vitorias eleitorais – Argentina, Estados Unidos, Bolívia. Bolsonaro terá, como Trump, teve, que deixar se livre atirador, só atacar a velha política, a corrupção, como se ele não as praticasse abertamente. Será vitima do seu governo fracassado. Está claro que se chegará a 2022 ainda com a economia em recessão e com alto desemprego. Os efeitos da pandemia ainda se farão sentir, com o abastecimento precário de vacinas e ainda com as vitimas atuais da pandemia.

Um referendo que coloque o pais do Bolsonaro ou o pais do desenvolvimento econômico com distribuição de renda e emprego, com vacinas para todos, com democracia – será o cenário decisivo para a derrota do Bolsonaro e vitória das forcas democráticas.