“Agora eles estão deixando vocês entrarem com esses troços dentro do metrô?”, me perguntou um senhor de idade perto da estação Marechal Deodoro, em São Paulo.
Acenei que sim com a cabeça e o homem apertou o passo querendo tirar satisfações, falando em voz alta. Preferi continuar andando de bicicleta pra não puxar papo, porque ele parecia meio revoltado com a ciclovia ao lado da entrada do metrô.
O DCM percorreu um roteiro nas ciclovias recentemente implantadas no bairro de Higienópolis, entre as estações Marechal Deodoro e Santa Cecília.
Os maiores problemas para andar por lá não foram os carros, mas sim os pedestres e os problemas estruturais que ainda fazem parte das faixas criadas pela prefeitura.
Circulamos dois dias, numa segunda-feira e num sábado.
O transporte de bicicletas é proibido em metrôs em dias de semana e liberado somente após as 20h30. A situação melhora nos finais de semana, sendo permitido o uso a partir das 14h do sábado e durante o dia todo no domingo. Nos feriados, ele é permitido.
Fizemos o seguinte trajeto: saindo da estação Marechal Deodoro, descemos à direita na rua Dr. Albuquerque Lins para chegar até a Alameda Barros; de lá, seguimos à esquerda até a rua Frederico Abranches, cruzando a avenida Angélica, rua Martim Francisco e rua Dona Veridiana. Na segunda-feira, havia pouquíssimos ciclistas no local. Em compensação, o tráfego de carros era mais pesado. Não há aluguel de bicicletas em Higienópolis, nem pelo programa Bike Sampa, patrocinado pelo Itaú, ou pela Nossa Bike, do Instituto Parada Vital.
No sábado, o panorama era outro.
A ciclovia, diferente da ciclofaixa que é organizada com cones e monitorada por fiscais, tem um desnível no lado mais próximo da calçada. A diferença é tão aparente que, em um dia chuvoso, a metade mais funda concentrou um pouco de água, o que poderia provocar acidentes.
Além disso, logo após o cruzamento com a avenida Angélica, o trajeto da Alameda Barros apresentou obstáculos no caminho. Havia um bueiro arrancado na rua e marcado apenas por um cavalete da CET.
Se um ciclista desavisado passasse por cima do buraco, poderia se machucar caindo ali.
Na mesma Alameda Barros, os pedestres andavam na ciclovia como se ela fosse uma extensão da calçada. Pareciam não se preocupar em provocar um acidente. Ou, pior, não consideravam a via como um local para ciclistas. Muitos atravessavam fora da faixa de pedestres e só prestavam atenção nos carros. Uma família chegou a atravessar a pouco menos de um metrô na minha frente, me forçando a brecar bruscamente.
Os ciclistas de Higienópolis andam em uma velocidade reduzida e só ultrapassam uns aos outros quando existe margem de segurança para fazer isso. Muitos usuários de bicicleta da região levavam cargas de um local para outro, com uma caixa para carregá-las na frente dos guidões.
O único problema sério que tive com carros eram as conversões à direita ou à esquerda, mas todos deram uma indicação prévia com a seta. O ciclista também tem que dobrar atenção com entradas de estacionamento e acidentes na via, o que força os carros a utilizarem parte da ciclovia para desviarem do obstáculo, o que aumenta o congestionamento.
As ciclovias se cruzam. No entanto, o trajeto é bem desenhado na rua para que o usuário entenda por onde ele faz a curva. O problema é que esse traçado não acompanha necessariamente o movimento dos carros. Então, quando você for virar, fique atento com o movimento dos automóveis próximos, permanecendo longe de quem der seta, para evitar acidentes.
Há detalhes muito úteis no desenho da ciclovia. Antes de um ponto de ônibus, por exemplo, o ciclista verá um aviso bem nítido e uma interrupção parcial do trajeto. Desta forma, em ruas mais estreitas, os ônibus podem parar no ponto sem causar problemas com quem estiver em sua bicicleta.
“Olha, moço. Aqui não passa muito ciclista não. E essas faixas ai vão só aumentar o trânsito”, disse uma moradora que não quis posar para fotos. E parece que essa é a mentalidade de muitas pessoas por ali, independentemente da classe social.
Ela esquece que passam poucos ciclistas porque não há muita bicicleta pública disponível, as pessoas do bairro não ocupam o espaço e porque quem pedala é visto de forma excludente em Higienópolis.
As faixas estão longe de ser um tapete. Há bastante a fazer. O que não significa que não funcionem. Funcionam, sim. E, numa cidade com um trânsito doentio, tomada por carros até o gargalo, é fundamental brigar para que elas sejam aperfeiçoadas e não que para que sejam extintas.
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