‘Entrevista com Escritores Mortos’ 5: Sidonie Gabrielle Colette

Atualizado em 3 de julho de 2015 às 18:32
"Um relacionamento de sete anos é como ir com um marido para as colônias – quando se volta, ninguém a reconhece e você não sabe sequer  como se usa um vestido."
“Um relacionamento de sete anos é como ir com um marido para as colônias – quando se volta, ninguém a reconhece e você não sabe sequer como se usa um vestido.”

A “entrevista” abaixo faz parte de nossa série “Conversas com Escritores Mortos”. Nossa quinta entrevistada (seguindo o romancista russo Liev Tolstói, o libertino Giacomo Casanova, a escritora inglesa Virginia Woolf e o filósofo Sêneca) é a romancista francesa Sidonie-Gabrielle Colette (1873 – 1954). As frases abaixo foram retiradas do romance Chéri e do  conto Gigi.

Diga alguma coisa que a agrada, Madame Colette.

Elegância, sofisticação. Nunca fui surpreendida desarrumada, nem com o espartilho aberto, nem de chinelos durante o dia. “Nua, se quiserem”, sempre digo, “mas nunca desarrumada”.

Agora, algo que a desagrada.

A intimidade competitiva de mulheres levianas que um homem enriquece e depois abandona, que outro homem arruína – a amizade rancorosa de rivais à espreita da primeira ruga e do primeiro fio de cabelo branco.

Hmmm…

E relacionamentos longos. Por exemplo, sete anos. Um relacionamento de sete anos é como ir com um marido para as colônias – quando se volta, ninguém a reconhece e você não sabe sequer como se usa um vestido.

Acha então que o melhor é manter relacionamentos casuais?

O casamento não é proibido. É só que, em vez de se casar “de uma vez”, o melhor é se casar “por fim”.

Madame Colette… Apesar de estarmos no século XXI, muitas mulheres que pensam dessa maneira são vistas pela sociedade como, eeeer, vadias…

Sou especialista em “vadias”, como a senhora diz. Um pouquinho especialista. Uma “vadia” é uma dama que geralmente dá um jeito de receber mais do que dá. Compreende?

Sim. Me desculpe.

E sugiro que não saia por aí repetindo essas tolices. Chamar as pessoas e as coisas por seus nomes jamais fez bem a ninguém.

Prometo não fazê-lo, Madame. Mas, por falar em receber, estou admirando seu colar desde o início dessa conversa…

Foi-me dado por um rei.

Um grande rei?

Não. Um pequeno. Grandes reis não dão joias tão bonitas.

Por que não?

Na minha opinião, é porque eles não querem. Entre nós, os pequenos reis também não.

Nesse caso, a quem apelar?!

Bem, aos tímidos. Aos orgulhosos, também. E aos ambiciosos, porque pensam que dar uma joia valiosa é sinal de boa educação. Às vezes uma mulher o faz, para humilhar um homem. Permite uma sugestão? Nunca use joias de segunda categoria; espere até ganhar as boas.

E se eu jamais ganhá-las?

Bem, então não há o que fazer.

[a entrevistadora está magoada demais para responder]

Não fique assim. Vou lhe dar uma sugestão – nesse caso, em vez de usar um diamante falso, use um anel barato. Porque assim você pelo menos poderá dizer: “É um memento. Jamais separo-me dele, dia ou noite”.

Obrigada, Madame Colette. Alguma consideração final?

Para receber joias bonitas, é necessário conquistar um homem. E quer saber o melhor meio de conquistá-lo?

Quero.

Seja supersticiosa.

[em deplorável estado de confusão, a apresentadora fica em silêncio]

Superstição é sinônimo de fraqueza, minha criança, e uma bela coleção de fraquezas – e de medo de aranha! – são nossas melhores moedas de troca com os homens. A cada 10 homens, 9 são supersticiosos; e, a cada 20, 19 acreditam em mau olhado. E 98 a cada 100 tem de medo de aranha. Eles nos perdoam – oh! Eles perdoam muitas coisas… Mas não a ausência em nós de seus próprios temores.