“Vai, gostosa!”

Atualizado em 17 de março de 2013 às 5:44

Fora todos os problemas, as ciclistas ainda têm que enfrentar o machismo primitivo de motoristas.

Mulher + bicicleta no Google
Mulher + bicicleta no Google

O texto abaixo, de autoria da designer paulistana Marina Chevrand, foi publicado originalmente no site Pedalinas, que congrega mulheres que andam de bicicleta.

Assédio no trânsito não é assunto novo por aqui. Agressões verbais todas nós, mulheres que pedalam, provavelmente já sofremos.

Mas vem cá, ja imaginou estar subindo uma avenida (a Sumaré, no caso), em pleno domingo, feliz e contente por ter poucos carros na rua, e perceber que um carro reduz a velocidade e sentir uma palmada bem dada na bunda seguido de um “vaaaaai coisa gostooooosa” e várias risadas de um bando de playboys?

Nunca imaginou? Nem eu. Mas isso aconteceu comigo, mas o carro preto de placa 2416 e a cara do mauricinho orgulhoso de seu ato machão-ogro de camisa amarela olhando e rindo de mim no retrovisor, eu nunca vou esquecer.

Pra mim, um cara que faz algo desse tipo é o mesmo que estupra e bate na mãe. O caráter (zero) e a certeza de que o mundo gira em volta do seu pinto são características comuns a esses seres desprezíveis.

Poderia fazer uma lista do que senti ao tomar o tapa: ódio, vergonha, humilhação, revolta, raiva, etc, etc, etc. E todos esses sentimentos juntos me deram forças nas pernas para pedalar na velocidade maior que eu pude com o intuito de alcançar o 2416, 2416, 2416 – repetia para mim mesma.

Rá! Lá estavam eles, distraídos e cantando esperando o sinal verde. Cheguei devagarzinho sem ser percebida pela direita. Com muita vontade, cuspi e vomitei na cara do de amarelo, arremesei-o para fora do carro, chutei bem no meio do seu saco. Não tive pena da sua cara de pavor, me pedindo peloamordedeus para parar. Não parei. Seus amigos-super-machões, se envergonharam do amigão que dá tapas em bundas de mulheres estar apanhando de uma de suas vítimas, e fugiram, deixando-o para trás.

Obviamente esse é o final que minha criatividade alimentada de ódio e revolta produziu.

O final real é bem diferente disso: infelizmente (ou felizmente) todos os sinais estavam abertos, não tinha congestionamento e os perdi de vista. Me recolhi no meu suor e humilhação e engoli seco para conseguir terminar o dia sem matar um.

Postei essa foto no início do meu post, que é o resultado de uma busca no google das palavras “mulher + bicicleta”. E isso resume muito bem tudo o que escrevi. Tirem suas próprias conclusões.

Desculpem o relato meio pesado para uma segunda feira. E sorte pra todas nós, que vamos pedalar muito ainda durante toda a semana. Que pessoas como essas não cruzem nosso caminho e não estraguem nosso dia (e muito menos nossa dignidade).