“Vale Tudo” revela o colapso ético da Globo: vilã viva, valores mortos

Atualizado em 18 de outubro de 2025 às 15:03
Odete Roitman (Debora Bloch) após ser baleada em “Vale Tudo”. Foto: reprodução

O desfecho do remake de “Vale Tudo” virou símbolo de uma virada ética na Globo. A decisão de manter Odete Roitman viva — e rica — foi criticada pelo pesquisador Rogerio Ferraraz, da USP, em entrevista à CNN. Para ele, a opção da emissora reforça a ideia de que o crime compensa no país e mostra o quanto a emissora prioriza o lucro sobre a narrativa. “A própria história mostra que a desonestidade ainda vence”, afirmou.

Ferraraz lembrou que, na versão original de 1988, Odete (Beatriz Segall) morria e a protagonista Raquel (Regina Duarte) representava a vitória da honestidade. Agora, a Globo inverteu os papéis: a vilã sobrevive, foge e se torna o rosto do sucesso. “Essa ambiguidade pode ser vista como um reflexo do Brasil: um país onde a honestidade existe, mas a desonestidade ainda tem muito espaço”, explicou. O professor também observou que a emissora explorou o carisma da personagem para manter a audiência, mesmo que isso comprometesse o sentido moral da trama.

A crítica não se limitou ao roteiro. Segundo Ferraraz, o capítulo final de “Vale Tudo” foi estendido para acomodar ainda mais publicidade, o que garantiu à Globo o maior faturamento da história de sua faixa das 21h: mais de R$ 200 milhões, segundo a revista Exame. “Comercialmente, foi uma vitória. Dramaturgicamente, prejudicou o ritmo da história. A autora precisou adaptar o roteiro a essas demandas”, disse. Para o pesquisador, o sucesso comercial veio acompanhado de uma perda simbólica: a emissora que já se vendia como defensora de valores éticos parece agora celebrar o oposto.

O professor também comentou o tom cômico e por vezes “trash” do remake, que transformou o drama original em uma caricatura de si mesmo. “Esse humor contaminou até os núcleos mais dramáticos, comprometendo a profundidade da narrativa”, avaliou. Ainda assim, ele reconheceu acertos na atualização de personagens como Maria de Fátima (Bella Campos), influenciadora obcecada por fama. “Há méritos e falhas, mas o sucesso comercial mostra que ‘Vale Tudo’ continua um fenômeno.”

Jose Cassio
JC é jornalista com formação política pela Escola de Governo de São Paulo