Vazamento da delação de Palocci confirma a suspeita: vem aí mais uma farsa. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 3 de julho de 2018 às 11:47
Ele

Aos poucos, com os vazamentos da Polícia Federal que começam a alimentar a velha imprensa, se vai conhecendo detalhes da farsa da delação de Antonio Palocci.

O Globo publica hoje um ponto do acordo feito entre a PF e o ex-ministro da Fazenda, homologado no dia 22 de junho pelo desembargador João Pedro Gebran Neto, do Tribunal Regional Federal da 4a. Região.

O acordo está sob sigilo, mas tal condição não impediu que “fontes da PF” liberassem parte do seu conteúdo: Palocci vai entregar os arquivos dos computadores da sua consultoria, que estavam desaparecidos.

Quando a PF fez a operação de busca e apreensão na sede da consultoria do ex-ministro em São Paulo, em setembro de 2016, encontrou monitores, teclados e mouses, mas não o desktop — no lugar, havia notebooks novos.

Esse cenário, aparentemente montado para dissimular a retirada dos desktops com os arquivos mais importantes da consultoria, é que teria levado ao pedido de conversão do decreto de prisão temporária do ex-ministro em prisão preventiva, condição que o mantém encarcerado até hoje.

No acordo homologado pelo desembargador Gebran, Palocci prometeu entregar o conteúdo dos arquivos, mas fará isso através de uma perícia particular.

Segundo o jornal, os dados dos computadores da Projeto (nome da empresa de Palocci) ainda não foram entregues à PF porque estão passando por uma análise de peritos contratados por Palocci.

Os consultores particulares estariam fazendo esse serviço para “facilitar o trabalho dos investigadores”: organizarão “o material de maior relevância”, supostamente filtrariam apenas os conteúdos que envolvem crimes.

Aí é que está o perigo, a manobra para proteger alguns e incriminar outros, sem falar na possibilidade de forjar provas.

Exagero?

Quando a Odebrecht celebrou acordo de delação premiada, também foi feita essa filtragem antes, através de uma empresa suíça, a FRA.

A empresa fez supostas “cópias forenses” do sistema My Web Day (contabilidade) e Dousys (comunicação, tipo whatsapp), armazenados em servidores da Suíça. A PF recebeu um HD e alguns pen drives.

Ao mesmo tempo em que se tornavam públicas as inconsistências de alguns arquivos, claramente adulterados, a defesa do ex-presidente Lula contratou uma empresa inglesa para fazer uma perícia dessas cópias.

A CCL, que tem entre seus integrantes antigos peritos da Scotland Yard, concluiu que não é possível garantir que não houve havido adulteração, pois, para ter essa garantia, era preciso comparar as cópias com o sistema original.

Mas este sistema original está inacessível, já que foi cadeado digitalmente e ninguém consegue abri-lo.

Em outras palavras, as cópias extraídas pela FRA são imprestáveis do ponto de vista forense.

Isso não impediu, entretanto, que houvesse decreto de prisão e até condenação com base nas “provas” fornecidas pela Odebrecht.

A maior evidência de que provas foram forjadas no caso da Odebrecht é a revelação de documentos por parte do advogado Rodrigo Tacla Durán, que prestou serviços para a Odebrecht e hoje mora na Espanha.

O juiz Sergio Moro, no entanto, indeferiu todos os pedidos de que ele fosse ouvido como testemunha.

Tacla Durán, que tinha acesso ao Drousys da Odebrecht, possui extratos e planilhas originais e os comparou com as cópias juntadas pelo Ministério Público Federal: são diferentes.

No caso da Odebrecht, outro indício de que o sistema foi adulterado é o depoimento de um diretor da empresa, Fernando Migliaccio.

Ele admitiu que, em 2015, antes que as supostas cópias dos sistemas da Odebrecht fossem entregues, houve reunião de executivos da empresa em Madri, na Espanha.

Lá, decidiram tomar providência para se protegerem. Tacla Durán contou que participou dessa reunião e ali houve a decisão de cortar o tracking do dinheiro, isto é, impedir seu rastreamento.

Segundo o advogado que Moro se recusa a ouvir, foi assim, por exemplo, que contas do publicitário João Santana desapareceram das planilhas entregues à Lava Jato em Curitiba.

No caso de Palocci, a PF diz que ele entregará também os HDs originais, assim como a Odebrecht fez no caso do acordo de leniência dela. Mas para que serviram? Ninguém abriu.

O que está em jogo, além da saída dele da prisão para usar tornozeleira eletrônica em casa durante algum tempo, é a quantia de R$ 30 milhões da empresa de consultoria, que estão bloqueados.

Segundo o acordo, caberá a Moro decidir sobre sua liberação — há alguma dúvida de que, depois de dizer a Moro o que este quer sobre Lula, o dinheiro será liberado?

A Odebrecht também recebeu varias imunidades em troca da entrega do seu sistema e do depoimento dos seus executivos. Mas, quando ficou evidente que ela havia entregado gato por lebre, o acordo não foi rescindido.

Pelo contrário: ao manterem as cláusulas do acordo, os agentes do Estado chancelaram o que fez a empresa. Com Palocci, tudo indica o mesmo caminho.

O ex-ministro, ao oferecer a Moro a cenourinha da grande empresa de comunicação (leia-se Globo) que ele ajudou a não quebrar, lubrificou a engrenagem que levou ao acordo.

Hoje, o jornal do grupo publica o vazamento de que Palocci vai entregar os arquivos da consultores, depois de bondosamente peritos contratados por ele selecionarem o que vale a pena ser investigado.

Quem acredita que os dados (ou registro de pagamentos, sabe-se lá) referentes à grande empresa de comunicação estarão nesses arquivos?

.x.x.x.

PS: O vídeo sobre a recompensa de Palocci para entregar Lula: