Verão europeu: Ver Nápoles e depois morrer

Atualizado em 23 de julho de 2012 às 13:01
A baía de Nápoles, com o Vesúsio a postos

 

Alguém já definiu Nápoles como o Rio de Janeiro da Itália. Duas cidades bonitas, litorâneas – e onde a convivência com a malandragem é parte do cotidiano e do espírito. O aspecto folclórico disso está no sotaque, na simpatia dos napolitanos, na paisagem, no jeitão easygoing – e também na possibilidade de sua carteira ser batida a qualquer momento, como a minha. “Cidade de merda”, tuitou a modelo argentina Yanina Screpante, namorada do atacante do time do Napoli Ezequiel Lavezzi. Ela teve ser Rolex roubado por ladrões armados.

Evidentemente a indignação da bela Yanini era legítima, mas seu julgamento estava completamente equivocada. Em seu caos, em sua bagunça, em seu trânsito, nos muambeiros, em sua pizza margheritta, em sua natureza rebelde do sul da Itália, Nápoles é uma maravilha. Capital da região da Campania, é a terceira metrópole italiana, atrás de Roma e de Milão. É uma das cidades por mais tempo continuamente habitadas do mundo, desde o século 8 a.C.. O centro histórico é patrimônio da Humanidade e seu dialeto é protegido por lei.

É também a sede da Camorra, a máfia napolitana, e se você gosta do assunto, como eu, verá personagens suspeitos, acompanhados de seguranças suspeitos, em cada canto suspeito. Verá também cenas lindas, saídas de filmes de Scola ou Dino Risi, como o casal que tirava fotos para o álbum de casamento na monumental Piazza Plebiscito, batizada assim por causa do plebiscito que determinou que Nápoles estava unificada ao Reino da Itália em 1860.

 

Fotos para o álbum de casamento na Piazza Plebiscito

O coração é o Quartiere Spagnoli, vários quarteirões de prédios de seis andares, amontoados, alguns quase cortiçoes, construídos no século 16 para abrigar os soldados espanhóis durante a dominação da coroa espanhola. Tem cerca de 14 mil pessoas em 800 mil metros quadrados de ruas estreitas, onde passa um e apenas um carro ou uma manada de Vespas, repleto de mercados, restaurantes, bares, velhos, crianças, trambiqueiros, santuários encrustados na parede para Nossa Senhora e para Maradona (ex-atacante e santo padroeiro do Napoli), prostitutas e membros da Camorra – além, é claro, da boa e honesta gente napolitana.

O aperto das ruas

O lado bom e ruim do Quartiere Spagnoli é que ele não foi – ah, essa palavrinha tão gasta – reurbanizado, não ficou cool, não ganhou nenhum hotel butique para turistas bacanas que têm medo de sair do quarto. É a vida real, em sua imensa falta de sentido, sem maquiagem. Como diz Próspero em A Tempestade, de Shakespeare, quando Miranda vai vê-lo na prisão napolitana, acompanhada por Ferdinando, filho do rei de Nápoles. “Tal como o grosseiro substrato desta vista, as torres que se elevam para as nuvens, os palácios altivos, as igrejas majestosas, o próprio globo imenso, com tudo o que contém, hão de sumir-se, como se deu com essa visão tênue, sem deixarem vestígio. Nós somos feitos da matéria de que são feitos os sonhos”.

Um sonho barulhento. Ou, segundo um provérbio local: é ver Nápoles e depois morrer.

Tutti buona...: o segurança, a noiva e o babbo
Hotel butique? Che cazzo?
O mercado de rua
Auguri!
Gelatto

 

O quartiere Vomero, na parte alta da cidade