Veto à lei que protege criança reacende caso em que Flávio Bolsonaro aparece em fotos ao lado de coronel pedófilo

Atualizado em 15 de dezembro de 2019 às 12:20
Flávio Bolsonaro com coronel pedófilo
Em outra oportunidade, os dois juntos

O veto de Jair Bolsonaro a um projeto da deputada Gleisi Hoffmann que protege os menores evocou um assunto incômodo para a família Bolsonaro: as duas fotos em que o senador Flávio aparece ao lado de um coronel reformado da Polícia Militar do Rio de Janeiro preso em flagrante em 2016 por pedofilia.

A deputada Gleisi Hoffmann, presidente do PT, é autora do projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que autoriza o Ministério Público a mover ação criminal contra autores de crimes contra menores de idade independentemente da vontade dos pais.

Ao explicar o veto, em uma transmissão ao vivo pela internet, Bolsonaro apresentou argumento descabido, que nada tem a ver com a proposta de Gleisi.

“Eu vetei integralmente um projeto que chegou para mim esta semana. O Congresso votou um projeto de lei mais ou menos o seguinte, sendo bastante objetivo aqui: um menor, uma vez sofrendo uma agressão de um adulto, ele era representado pelos pais junto à delegacia. A partir de agora, com esse projeto, caso ele se transformasse em uma lei, independia da vontade dos pais. Então qualquer notícia de jornal, de uma agressão de menor, o Ministério Público moveria ação contra esse maior. O que você acha disso? O MP, independente da  manifestação dos pais, representaria o menor que por ventura tivesse sofrido uma agressão. Eu vetei o projeto. Teve gente que acha que eu errei porque nós devemos defender a criança no Brasil, a criancinha de até dezessete anos de idade. (…) O que eu vi? Imagine uma ação qualquer policial onde o menor seja detido ou sofra uma agressão, até verbal. Esse policial vai ser processado. O MP vai para cima dele.”

O projeto não trata de violência policial, mas principalmente da agressão doméstica, como explicou a deputada.

“O crime de lesões corporais já é processado pelo MP, mesmo sem manifestação da vítima. Isso não ocorre para crimes de lesões corporais leves e culposas, exceção para as vítimas menores do sexo feminino, por conta da Lei Maria da Penha. Minha proposta é estender para menores do sexo masculino”, disse.

Na explicação do veto, Bolsonaro ainda aproveitou para atacar Lula, com a deturpação de uma declaração que o ex-presidente deu em entrevista. Especulando sobre as intenções de Gleisi, Bolsonaro disse:

“Talvez seja porque o Lula falou “só porque o moleque está roubando aí um celular, vai a polícia pra cima dele. Deixa o moleque roubar em paz’”, declarou, imitando a voz do Lula.

Gleisi reagiu:

“Bolsonaro não leu meu projeto e nem a exposição de motivos do seu próprio veto. Desandou a falar besteira, acusar o que não é, e jogar discurso para os policiais. O projeto não trata de policiais e sim de violência doméstica! Além disso, mostrou que não consegue ignorar Lula.”

Bolsonaro claramente tentou tirar proveito político de uma questão de direito do menor. Já Gleisi, não. Mas poderia fazer como alguns internautas, que não perdoaram Bolsonaro e associaram o veto a uma suposta amizade de Flávio com o coronel pedófilo.

Um deles republicou uma foto em que Flávio Bolsonaro aparece ao lado do coronel da PM reformado Pedro Chavarry Duarte, em um evento de 2012, em que ambos participaram.

Quatro anos depois da foto — em 2016, portanto –, o coronel foi preso em flagrante no interior de um carro com uma criança de dois anos de idade nua. Como desdobramento desse flagrante, houve outras denúncias, e o coronel foi apontado como participante de uma rede de pedófilos, com a denúncia de um pré-adolescente que também teria sido abusado por ele.

A foto de Flávio Bolsonaro com o pedófilo não significa nada em si. Políticos tiram foto com todo mundo, e PMs da ativa ou reformados fazem parte do núcleo duro de apoiadores da família Bolsonaro, além, é claro, os milicianos.

O que chamou a atenção à época foi a reação desproporcional de Flávio Bolsonaro, no mesmo tom da resposta que Jair Bolsonaro deu à Globo recentemente quando foi divulgado o caso do porteiro.

Flávio, então candidato a prefeito do Rio de Janeiro, ameaçou processar todo mundo que compartilhasse a foto.

“Quero falar para essa meia dúzia de vagabundos que está espalhando foto minha junto com o coronel que foi preso em flagrante agora, aliciando menor, com menor pelada dentro do carro dele, que vocês parem com isso e me respeitem”, disse.

Foi muito mais do que meia dúzia que divulgou a foto, e ele não processou ninguém, até onde se sabe.

O projeto de Gleisi não inova no tratamento que a Justiça deve dar a casos de pedofilia como o que levou o coronel Chavarry Duarte à cadeia. Mas mostra uma preocupação com fragilidade de crianças, algo que não sensibilizou Jair Bolsonaro, que preferiu fazer média com o núcleo duro de seus apoiadores.

Os PMs já têm poder suficiente, sobretudo oficiais. Não precisam de mais leis que o protejam.

Um exemplo desse poder é o próprio caso do coronel. Três anos depois, ele ainda recebe salário de R$ 34 mil da PM, apesar de condenado a 11 anos de prisão e de um processo administrativo aberto para expulsá-lo da corporação.

O oficial conseguiu suspender recentemente o processo administrativo no Tribunal de justiça do Rio de Janeiro.

Usar a foto de Flávio para associá-lo a um pedófilo é exagero. Mas dizer que Jair Bolsonaro menospreza a proteção a crianças e adolescentes não é nenhum absurdo. Pelo contrário.