
Às vésperas de se encontrar com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) endureceu o tom contra o protecionismo e propôs o uso de moedas nacionais em transações comerciais com a Indonésia. O discurso foi feito nesta quinta-feira (23), em Jacarta, durante visita oficial ao país asiático. Lula disse que Brasil e Indonésia não devem ser “dependentes de ninguém” e defendeu o multilateralismo como caminho para uma nova ordem econômica global.
“Indonésia e Brasil não querem uma segunda Guerra Fria. Nós queremos comércio livre. E, mais ainda, tanto a Indonésia quanto o Brasil têm interesse em discutir a possibilidade de comercialização entre nós dois ser com as nossas moedas”, afirmou Lula.
“Essa é uma coisa que nós precisamos mudar. O século XXI exige que tenhamos a coragem que não tivemos no século XX. Exige que a gente mude alguma forma de agirmos comercialmente para não ficarmos dependentes de ninguém”.
A fala foi interpretada como uma resposta direta ao governo estadunidense, que vem intensificando barreiras tarifárias desde o retorno de Trump à Casa Branca. Em abril, Washington aplicou um tarifaço global de 10% sobre exportações brasileiras, ampliado para 40% em julho, sob justificativa de “emergência nacional”. O Brasil vê como assimétrico o acordo que os Estados Unidos negociaram com a Indonésia, que prevê tarifa zero para produtos estadunidenses e redução geral para 19%.
Trump tem criticado abertamente países que discutem a “desdolarização” do comércio internacional, pauta defendida por integrantes do Brics, grupo que inclui Brasil e Indonésia.
O presidente estadunidense chegou a ameaçar uma taxa de 100% sobre exportações dos países que aderirem à ideia. Apesar disso, Lula reafirmou o compromisso com o bloco e disse apoiar o ingresso da Indonésia no Novo Banco de Desenvolvimento, instituição financeira do Brics.
O encontro entre Lula e Trump deve ocorrer no domingo (26), em Kuala Lumpur, na Malásia, durante a 47ª Cúpula da ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático). Será a primeira reunião presencial entre os dois desde que o republicano voltou à Presidência dos EUA, em meio à pior crise diplomática entre os países em décadas. O Palácio do Planalto espera tratar da sobretaxa imposta aos produtos brasileiros e da crise na Venezuela, agravada por novas sanções estadunidenses.
Durante o discurso em Jacarta, ao lado do presidente Prabowo Subianto, Lula defendeu o diálogo entre economias emergentes e destacou que Brasil e Indonésia são “duas potências em ascensão”.
“O que está acontecendo na política e na economia demonstra que precisamos discutir as similaridades entre os nossos dois países, para que a gente possa, cada vez mais, fazer crescer a nossa relação comercial, científica, tecnológica, cultural e política”, afirmou o petista.
Os dois governos assinaram acordos nas áreas de estatística, agricultura, energia, ciência e tecnologia, além de promoção comercial. Também decidiram acelerar as negociações para a conclusão de um Acordo de Comércio Preferencial entre o Mercosul e a Indonésia até o fim do ano. Lula citou a importância histórica do país asiático, sede da Conferência de Bandung em 1955, que lançou as bases do movimento dos países não alinhados durante a Guerra Fria.
O presidente brasileiro aproveitou para criticar a dependência de combustíveis fósseis e defender uma transição energética justa. “Estamos entre os maiores países detentores de florestas tropicais e com maior biodiversidade do mundo. Também somos grandes produtores de biocombustíveis, que terão papel fundamental na transição para economias de baixo carbono”, afirmou.
Lula e Subianto também abordaram a guerra na Faixa de Gaza e defenderam o cessar-fogo imediato: “Indonésia e Brasil compartilham o compromisso com a paz, com o desenvolvimento sustentável e com a promoção de uma ordem internacional mais justa. Nossos governos estão unidos contra o genocídio em Gaza e continuarão a defender a solução de Dois Estados como o único caminho possível para a paz no Oriente Médio”.