VÍDEO: Praça no Rio amanhece com pilha de pelo menos 55 corpos após chacina

Atualizado em 29 de outubro de 2025 às 10:36
Corpos enfileirados na Praça da Penha, no Rio. Foto: Betinho Casas Novas/g1

A madrugada desta quarta-feira (29) foi marcada por uma das cenas mais chocantes da história recente do Rio de Janeiro. Moradores do Complexo da Penha, na Zona Norte da cidade, levaram mais de 70 corpos até a Praça São Lucas, na Estrada José Rucas, um dia após a megaoperação policial que deixou, segundo dados oficiais, ao menos 81 presos. Entre as vítimas estão quatro policiais.

Os corpos foram encontrados em uma área de mata entre os complexos da Penha e do Alemão, na Serra da Misericórdia, onde se concentraram os confrontos entre forças de segurança e traficantes do Comando Vermelho. Moradores afirmaram que ainda há mortos no alto do morro e que o número de vítimas pode ser muito maior do que o divulgado.

De acordo com a advogada Flávia Fróes, que acompanhou a remoção dos corpos deixados pela chacina do governo Cláudio Castro (PL), muitos apresentavam sinais de execução. “Alguns deles têm marcas de tiros na nuca, facadas nas costas e ferimentos nas pernas”, relatou à Folha.

A defensora classificou a ação policial como “o maior massacre da história do Rio de Janeiro” e defendeu a intervenção de peritos internacionais. “A situação exige a presença da Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, afirmou.

O cenário descrito pelos moradores é de horror. Um dos corpos estava sem cabeça, cuja parte foi trazida em uma sacola. Um homem que ajudava na remoção gritou: “é um de cabelo vermelho”, enquanto segurava o corpo que ainda tinha as mãos fechadas, agarradas à grama.

Crianças participaram da retirada das vítimas, incluindo um menino de cerca de nove anos. Uma mulher gritava em desespero: “polícia assassina, cadê meu filho?”.

“Em 36 anos de favela, passando por várias operações e chacinas, eu nunca vi nada parecido com o que estou vendo hoje. É algo novo. Brutal e violento num nível desconhecido”, declarou em entrevista ao G1 o ativista Raull Santiago, que ajudou no resgate.

Segundo ele, os corpos levados à praça não estão na contagem oficial dos 64 mortos divulgada pelo governo estadual. Caso sejam confirmadas as novas mortes, o total de vítimas pode ultrapassar 100.

O governo do Rio havia informado que 60 criminosos e quatro policiais morreram durante a operação, mas o secretário da Polícia Militar, coronel Marcelo de Menezes Nogueira, reconheceu que os corpos encontrados na Praça São Lucas não constam da lista oficial. “Haverá uma perícia para confirmar se há relação entre essas mortes e a operação”, disse.

O traslado dos corpos, segundo os moradores, teve o objetivo de facilitar o reconhecimento por familiares. Ao amanhecer, mulheres choravam e se abraçavam diante dos cadáveres enfileirados.

“Meu filho”, gritava uma delas ao reconhecer o corpo. Em meio a fotógrafos e cinegrafistas, as imagens revelaram um cenário descrito por testemunhas como “uma cena que entra para a história de terror do Brasil”.

A Polícia Civil informou que o atendimento às famílias para o reconhecimento das vítimas será feito no prédio do Detran, ao lado do Instituto Médico-Legal (IML), a partir das 8h. Durante esse período, o acesso ao IML será restrito à Polícia Civil e ao Ministério Público, responsáveis pelos exames periciais. As necropsias de casos sem relação com a operação serão realizadas no IML de Niterói.

Mais cedo, moradores também levaram seis corpos em uma Kombi até o Hospital Estadual Getúlio Vargas, na Penha. O veículo chegou em alta velocidade, deixou os corpos na entrada e saiu rapidamente do local.

 

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.