
A madrugada desta quarta-feira (29) foi marcada por uma das cenas mais chocantes da história recente do Rio de Janeiro. Moradores do Complexo da Penha, na Zona Norte da cidade, levaram mais de 70 corpos até a Praça São Lucas, na Estrada José Rucas, um dia após a megaoperação policial que deixou, segundo dados oficiais, ao menos 81 presos. Entre as vítimas estão quatro policiais.
Os corpos foram encontrados em uma área de mata entre os complexos da Penha e do Alemão, na Serra da Misericórdia, onde se concentraram os confrontos entre forças de segurança e traficantes do Comando Vermelho. Moradores afirmaram que ainda há mortos no alto do morro e que o número de vítimas pode ser muito maior do que o divulgado.
De acordo com a advogada Flávia Fróes, que acompanhou a remoção dos corpos deixados pela chacina do governo Cláudio Castro (PL), muitos apresentavam sinais de execução. “Alguns deles têm marcas de tiros na nuca, facadas nas costas e ferimentos nas pernas”, relatou à Folha.
ATENÇÃO: IMAGENS FORTES 🔴
Moradores levam ao menos 50 corpos para praça no Complexo da Penha após operação mais letal do Rio
A reportagem do Estadão tentou contato com a Polícia Militar e a Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, mas não obteve retorno pic.twitter.com/dNSEgEtIVf
— Estadão 🗞️ (@Estadao) October 29, 2025
A defensora classificou a ação policial como “o maior massacre da história do Rio de Janeiro” e defendeu a intervenção de peritos internacionais. “A situação exige a presença da Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, afirmou.
O cenário descrito pelos moradores é de horror. Um dos corpos estava sem cabeça, cuja parte foi trazida em uma sacola. Um homem que ajudava na remoção gritou: “é um de cabelo vermelho”, enquanto segurava o corpo que ainda tinha as mãos fechadas, agarradas à grama.
CHACINA NO RIO DE JANEIRO. Aqui estão pelo menos 40 corpos; faltando mais 10 que ainda estão descendo, no Complexo da Penha, e 6 que foram levados por moradores do Complexo do Alemão a um hospital local; fora os 64 corpos já noticiados. OU SEJA, pelo menos 120 MORTES.
CLÁUDIO… pic.twitter.com/VCFmzdFhrk— Jeje ✨ (@jejezaum) October 29, 2025
Crianças participaram da retirada das vítimas, incluindo um menino de cerca de nove anos. Uma mulher gritava em desespero: “polícia assassina, cadê meu filho?”.
“Em 36 anos de favela, passando por várias operações e chacinas, eu nunca vi nada parecido com o que estou vendo hoje. É algo novo. Brutal e violento num nível desconhecido”, declarou em entrevista ao G1 o ativista Raull Santiago, que ajudou no resgate.
Segundo ele, os corpos levados à praça não estão na contagem oficial dos 64 mortos divulgada pelo governo estadual. Caso sejam confirmadas as novas mortes, o total de vítimas pode ultrapassar 100.

O governo do Rio havia informado que 60 criminosos e quatro policiais morreram durante a operação, mas o secretário da Polícia Militar, coronel Marcelo de Menezes Nogueira, reconheceu que os corpos encontrados na Praça São Lucas não constam da lista oficial. “Haverá uma perícia para confirmar se há relação entre essas mortes e a operação”, disse.
O traslado dos corpos, segundo os moradores, teve o objetivo de facilitar o reconhecimento por familiares. Ao amanhecer, mulheres choravam e se abraçavam diante dos cadáveres enfileirados.
🇧🇷⚠️ Durante a madrugada desta quarta-feira (29), vários corpos de criminosos do Comando Vermelho (CV) foram retirados por moradores de uma mata na Vila Cruzeiro, que divide os Complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro.
Segundo os relatos de moradores, os corpos foram… pic.twitter.com/BpNQF06klg
— 🇧🇷🇮🇹 Gabriel Ferrigno | Geopolítica (@bielferrigno) October 29, 2025
“Meu filho”, gritava uma delas ao reconhecer o corpo. Em meio a fotógrafos e cinegrafistas, as imagens revelaram um cenário descrito por testemunhas como “uma cena que entra para a história de terror do Brasil”.
A Polícia Civil informou que o atendimento às famílias para o reconhecimento das vítimas será feito no prédio do Detran, ao lado do Instituto Médico-Legal (IML), a partir das 8h. Durante esse período, o acesso ao IML será restrito à Polícia Civil e ao Ministério Público, responsáveis pelos exames periciais. As necropsias de casos sem relação com a operação serão realizadas no IML de Niterói.
Mais cedo, moradores também levaram seis corpos em uma Kombi até o Hospital Estadual Getúlio Vargas, na Penha. O veículo chegou em alta velocidade, deixou os corpos na entrada e saiu rapidamente do local.
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