O presidente do Superior Tribunal Militar (STM), Luis Carlos Gomes Mattos, minimiza os áudios que comprovam tortura na ditadura, nesta terça-feira (19).
Durante a primeira sessão da Corte após a divulgação dos áudios, Gomes Mattos disse que as gravações eram “tendenciosas” e que a Justiça militar não tem “resposta nenhuma para dar”.
“A gente já sabe os motivos do porquê que isso vem acontecendo agora, nesses últimos dias, seguidamente, por várias direções, querendo atingir Forças Armadas, o Exército, a Marinha, a Aeronáutica. E, sem dúvida, nós somos quem cuida da disciplina, da hierarquia, que são os nossos pilares das nossas Forças Armadas. Nós não temos resposta nenhuma para dar. Simplesmente ignoramos uma notícia tendenciosa daquela que nós sabemos o motivo, né?”, afirmou o presidente do STM.
Segundo Gomes Mattos, a revelação dos áudios no domingo (17), “não estragou a Páscoa de ninguém”. “A minha não estragou”, disse.
O presidente do tribunal ainda afirmou que esse “vira e mexe” incomoda e que “só varrem” o passado de “um lado”. “Não varrem o outro [lado]. É sempre assim. Nós estamos acostumados com isso. Então, deixa para lá.”
Veja o vídeo:
Áudios confirmam existência de tortura na ditadura
Foram revelados, no domingo (17), áudios do Tribunal Superior Militar que provam tortura na ditadura. O conteúdo foi publicado pela jornalista Míriam Leitão. Ao todo, são mais de 10 mil horas de gravações. Os áudios faram analisados pelo historiador Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Em um dos áudios, por exemplo, um general defende a apuração do caso de uma uma grávida de 3 meses que sofreu aborto após choques elétricos na genitália. Em outro, um ministro denuncia uma confissão de roubo a banco obtida a marteladas.
“Os militares devem desculpas”, diz ao DCM advogado que descobriu áudios de julgamentos de tortura
O advogado criminalista e pesquisador Fernando Fernandes falou com o DCM sobre os áudios que descobriu de julgamentos de tortura no STM (Superior Tribunal Militar) na ditadura.
Parte do material, que soma mais de 10 mil horas, veio à tona em reportagem de Míriam Leitão no Globo. Quem passou para ela foi o historiador Carlos Fico, titular de História do Brasil da UFRJ.
Fernandes pediu as gravações no final dos anos 90 no STM. Negaram-lhe. Ele então acionou o Supremo Tribunal Federal e, em 2011, a ministra Cármen Lúcia cedeu, mas a ordem só foi cumprida após a decisão do plenário.
Em 2015, ele estava com centenas de fitas de rolo nas mãos, que passaram a ser digitalizadas.
Tudo estará num site chamado “Voz humana”, em parceria com os professores Gisálio Cerqueira Filho e Gizlene Neder, da UFF (Universidade Federal Fluminense).
“Os militares devem desculpas”, disse Fernandes ao DCM.
Ele destacou a participação do general Rodrigo Otávio Jordão Ramos, que falava das sevícias a uma jovem grávida em 1977.
“Fato mais grave suscita exame, quando alguns réus trazem aos autos acusações referentes a tortura e sevícias das mais requintadas, inclusive provocando que uma das acusadas, Nádia Lúcia do Nascimento, abortasse após sofrer castigos físicos no Codi-DOI”, pontua Ramos na sessão.
“Lícia Lúcia Duarte da Silveira desejava acrescentar que quando esteve presa na Oban foi torturada, apesar de grávida, física e psicologicamente, tendo que presenciar as torturas infligidas a seu marido”.
Para Fernandes, famílias brasileiras “ainda não tiveram respeito, reconhecimento e o enterro dos desaparecidos. Não chegamos ao fim disso”.
“O STM serviu como mola de judicialização da repressão. As arbitrariedades não eram cometidas em calabouços sem o conhecimento dos chefes. Os chefes sabiam”, afirma.
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