
Soldados israelenses acusados de abusar de um prisioneiro palestino em um centro de detenção militar foram recebidos com aplausos ao comparecerem a um tribunal militar. Apesar das acusações e da divulgação de um vídeo que comprovaria os atos de violência, parte da classe política israelense e setores da sociedade têm tratado os envolvidos como “heróis nacionais”.
A controvérsia começou em agosto de 2024, quando a então procuradora militar Yifat Tomer-Yerushalmi divulgou à imprensa um vídeo gravado nas dependências de Sde Teiman, um centro de detenção controlado pelo Exército.
As imagens, obtidas durante uma investigação interna, mostram o momento em que reservistas da unidade Força 100 levam um prisioneiro palestino para uma área isolada, onde ele teria sido agredido e submetido a abusos físicos e psicológicos.
A divulgação levou inicialmente à prisão de nove soldados, mas a pressão de parlamentares e de grupos de extrema direita resultou na responsabilização de apenas cinco, e não pelas acusações mais graves. O vídeo, segundo Tomer-Yerushalmi, foi tornado público por “razões morais”, após o que ela descreveu como uma tentativa do Exército de encobrir os fatos.
Soldados israelenses filmados est*prando refém palestino em campo de tortura sionista são ovacionados em tribunal de "israel".
Est*pradores confessos, os soldados são tratados como "heróis" por lideranças políticas e membros do governo israelense, com aparições recorrentes na… pic.twitter.com/TXejAxqJTL
— FEPAL – Federação Árabe Palestina do Brasil (@FepalB) November 12, 2025
Enquanto o material provocou repúdio internacional e pedidos de apuração da ONU e de organizações de direitos humanos, dentro de Israel a reação foi distinta. Movimentos nacionalistas ocuparam as ruas pedindo a libertação dos soldados e o encerramento do caso. Ministros e deputados compareceram às audiências militares e manifestaram apoio público aos militares investigados.
O ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, elogiou os soldados, chamando-os de “heróis que protegeram o país em um momento de guerra”. Outros integrantes do governo afirmaram que “ações duras” seriam justificáveis em situações de combate contra grupos classificados como inimigos do Estado. O deputado Hanoch Milwidsky, do partido Likud, chegou a afirmar que “qualquer medida tomada contra terroristas é legítima durante operações de segurança”.
Entre os acusados, um dos militares libertados passou a dar entrevistas e a aparecer em programas de televisão, sendo tratado como ‘herói” pelo público e apresentado como símbolo da resistência israelense. Sua popularidade cresceu rapidamente, alimentando o discurso de setores que defendem a anistia a militares envolvidos em casos semelhantes.
O governo, por outro lado, concentrou seus esforços em descobrir quem vazou o vídeo. O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, pediu uma investigação criminal para identificar “os responsáveis por divulgar informações sigilosas que prejudicaram a imagem de Israel no exterior”.
Poucos dias depois, Tomer-Yerushalmi foi detida sob acusação de violar segredos de Estado e comprometer a segurança nacional. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu classificou a divulgação do vídeo como “um dos mais graves ataques de propaganda contra Israel” e criticou duramente a ex-procuradora.
Segundo o governo, o vazamento teria causado “danos irreparáveis à reputação do país”. A imprensa local, em grande parte alinhada ao discurso oficial, retratou a ex-procuradora como instável emocionalmente e responsável por criar um escândalo político em meio ao conflito.
Relatórios da ONU e de organizações internacionais de direitos humanos vêm denunciando, desde 2023, práticas recorrentes de maus-tratos em centros de detenção israelenses. No entanto, de acordo com dados da ‘Action on Armed Violence’, cerca de 88% das investigações militares sobre crimes de guerra em Israel acabam arquivadas ou sem resultados concretos, o que reforça críticas à impunidade no sistema.