Viva o ato pela democracia, mas sem ilusões… Por Gilberto Maringoni

Atualizado em 12 de agosto de 2022 às 22:05
Cartazes expostos em ato pela democracia na USP.

Por Gilberto Maringoni

O ato pela democracia do largo de São Francisco e a leitura concomitante da nova Carta aos Brasileiros em várias cidades do Brasil é manifestação da maior importância nesta conjuntura. Sepultam qualquer tentativa de golpe. Apesar de ocorrerem em meio à disputa eleitoral, eles não representam atividades de campanha. Por isso convém não superestimá-los e nem subestimá-los.

O significado maior dos acontecimentos está no que expressam: um setor do capital, dos ricos e da direita se descolou de Bolsonaro, com destaque para a Globo.

Entre os oradores deste 11 de agosto em São Paulo estavam dirigentes do movimento popular e vários representantes dos que apoiaram o desmonte do Estado nos anos 1990, os êmulos de Roberto Campos, Pedro Malan, Antonio Palocci, Henrique Meirelles, Joaquim Levy e até de Paulo Guedes. Marcaram presença vários dos que comemoraram o golpe de 2016, a prisão de Lula e as contrarreformas de Temer e Bolsonaro. Havia fidalgos endinheirados e gente de todas as Farias Lima do Brasil. Estavam os que vocalizaram uma escolha difícil em 2018. Não à toa, um ex-ministro de FHC exaltou ao microfone a união capital-trabalho em seu discurso. E isso é muito significativo.

Guardado quase meio século de distância – e um mundo diverso – há enormes pontos de contato com o ato de 1977.

A leitura da Carta aos Brasileiros original por um ex-militante integralista que fez do anticomunismo uma de suas razões de viver marcou o descolamento de uma parte da direita e dos apoiadores do golpe de 1964 da base de apoio à ditadura. Seu significado maior residiu nessa cisão. Lá e cá, os ricos e os liberais avisaram aos governos que agora deu. O afastamento não aconteceu principalmente por tais setores verem problemas no autoritarismo, mas pelos negócios começarem a ser afetados pelo desarranjo institucional. Essa observação meio óbvia precisa ser feita, para que não haja ilusões sobre caminhos a seguir.

É ótimo que o manifesto tenha obtido mais de um milhão de assinaturas. E é ótimo que líderes dos setores populares tenham usado da palavra para colocarem suas justas demandas em pauta. É ótimo que tenhamos uma ampla frente contra o neofascismo. Sem desprezar a legitimidade do que ocorreu, temos também de saber que cartas, manifestos e abaixo-assinados sozinhos não derrotarão a extrema-direita.

A derrota será eleitoral. Os eventos – ato e eleições – correm em trilhos paralelos, porém distintos. Entramos numa quadra preocupante da jornada até outubro. As pesquisas mostram a reação do boçal, graças às bondades temporárias que concede à população. É por isso que a campanha Lula – apesar do excepcional desempenho individual do candidato – precisa mudar e falar do futuro de forma concreta.

Sigamos na pedreira com otimismo da vontade e o pessimismo que nós dá a racionalidade de sempre.

Me parece ser esse o ritmo da batalha.

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Gilberto Maringoni
Gilberto Maringoni, professor de Relações Internacionais da UFABC e candidato do PSOL ao governo de São Paulo, em 2014