Uma das coisas mais malcompreendidas que preguei nas redações que dirigi foi a questão de seguir os bons exemplos.
A visão míope, ou maldosa, confundiu isso com cópia.
Nada mais errado. Trata-se apenas de encurtamento de caminho. Aprender com quem já fez o que você vai fazer.
Isso vale para tudo.
Considere um livro de Lytton Strachey sobre a literatura francesa, um tema em que ele era um erudito. Um primor. Strachey recebeu a incumbência de repetir o mesmo que um autor antigo fizera com a literatura latina.
Imitação? Cópia?
Não. Era apenas uma questão se seguir as placas.
Quantas coisas notáveis não poderiam ter sido feitas nas letras no Brasil caso o espírio da emulação não tivesse dominado as editoras de livros? Li com encanto, recentemente, a História da Inglaterra para as Crianças, de Dickens.
Por que ninguém fez ou faz nada parecido no Brasil?
De volta a Strachey.
Strachey – intelectual inglês do início dos anos 1900 de quem li recentemente uma soberba e premiada biografia da Rainha Vitória – escrevia com o estilo e a mordacidade típicos de um gênio gay. É um prazer lê-lo, quer pela embalagem , quer pelo conteúdo. Ele pertenceu ao aclamado Grupo Bloomsbury, do qual também fez parte o grande economista John Maynard Keynes. Foram amantes num momento. Ele foi casado com a pintora Dora Carrington, mas não por motivos sexuais. Seu interesse, neste campo, eram homens, apenas.
Você ri, você se entretém, você aprende com o livro de Strachey sobre a literatura francesa.
A análise que Strachey faz de Voltaire é notável. Voltaire escrevia com rapidez, e nem sempre com muito apuro. Era o oposto, nisso, de Flaubert, que se torturava em busca da frase perfeita. Strachey fala da “sublime mediocridade” das tragédias de Voltaire. Ele cita uma conversa de Voltaire com o enciclopedista D’Alembert que merece ser reproduzida aqui.
Voltaire contou orgulhoso a D’Alembert que escrevera uma peça em apenas seis dias. “Pois não devia ter descansado no sétimo”, respondeu D’Alembert.
Strachey fez um livro extraordinário porque teve a referência certa.
Poucas coisas são mais sábias, no jornalismo, do que fazer o que ele fez: emular quem deve ser emulado.