“Vou demitir as mulheres e contratar gays! Eles não engravidam”: o caso Maria Filó. Por Natheli Macedo

Atualizado em 2 de outubro de 2015 às 5:53

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“Vou demitir as mulheres e contratar gays! Eles não engravidam.”

Este foi o infeliz comentário de Alberto Osório, dono da rede de moda feminina Maria Filó, para uma funcionária grávida de uma de suas lojas.

Para justificar a gafe, Osório declarou que sua intenção era criar um clima descontraído, já que é conhecido por seu tom brincalhão.

A funcionária grávida não achou graça. Nós também não.

Esse tipo de brincadeira me parece lamentavelmente familiar. O humor tem licença para promover preconceitos. Piadas de gordos e de negros, por exemplo, ainda são encaradas por muitos como o bom e velho humor rasgado – e ai de quem o conteste. “O mundo anda politicamente correto demais”, eles dirão.

Não me surpreende ter lido tantos comentários acusando a funcionária de exagerada, aproveitadora e vitimista. O principal argumento dos piadistas preconceituosos de plantão é que antigamente se podia fazer piada sobre qualquer coisa, mas o mundo anda careta demais. Antigamente também podia-se escravizar pessoas pela cor da sua pele e negar direitos políticos às mulheres. Acontece que o mundo evoluiu – e que bom por isso.

É claro que é difícil se educar. Cada preconceito é um traço cultural de nosso povo e é complicado desvencilhar-se de suas armadilhas, mas é preciso se dar a esse trabalho. É estúpido transformar a opressão alheia em algo risível – e se há tantas coisas verdadeiramente risíveis por aí, porque insistir em um humor cruel?

A dura verdade é que os preconceitos ainda são tão naturalizados em nossa cultura que revolta não poder oprimir o outro e achar engraçado. Promover a igualdade é careta. Lutar para que o outro goze do mesmo respeito que queremos para nós é ser politicamente correto demais.

Vivemos a geração do empoderamento e da resistência, e é exatamente isso que tem incomodado. Negros que denunciam piadas sobre seus cabelos – aquelas mesmas piadas que eram tão naturais quando estávamos no colegial – gordos que se atrevem a revolucionar o mundo da moda, mulheres que não aceitam as opressões diárias antes tão banalizadas.

Isto que se tem chamado de ‘mimimi’ é a geração dos oprimidos que não mais aceitam a condição que lhes foi imposta por tanto tempo. Me parece que algumas pessoas reclamam o direito de permanecerem violentando o outro porque isso é cool, é descolado, é maneiro. Conseguem a proeza de pôr na opressão uma perigosa máscara de leveza e de bom-humor. E qualquer reação contrária é vitimismo careta e exagerado.

Se perpetuar preconceitos arcaicos é ser moderninho e descolado, que sejamos, então, uma geração cada vez mais careta.