Juíza que prendeu manifestantes da greve já propagou mensagens de grupos golpistas. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 2 de maio de 2017 às 15:58
Hoje de manhã, algemados, os manifestantes Juraci, Luciano e Rodrigues foram transferidos do 63º Distrito Policial para o Centro de Detenção Provisória (CDP) Independência, na Vila Prudente.

A juíza que decretou a prisão preventiva de três manifestantes da greve geral do dia 28 de abril costumava postar na rede social mensagens de grupos golpistas como o Vem pra rua e o Movimento Brasil Livre, que hoje dão sustentação ao prefeito Doria e a Michel Temer.

Basta verificar a página dela no facebook.

A juíza Marcela Filus publicou posts de convocação para atos pró-impeachment na avenida Paulista, substituiu a foto do perfil dela por uma do boneco inflável de Lula com roupa de presidiário, e fazia circular memes como um que afirma:

“A partir de agora, se Lula virar ministro, será confissão de culpa. Se prenderem Lula, será justiça. E se deixarem solto, será falta de vergonha na cara”.

Hoje de manhã a página da juíza já não podia mais ser acessada.

Os manifestantes que a juíza manteve em prisão preventiva – sem prazo para a libertação — são Juraci Alves dos Santos, que tem 57 anos e é frentista de posto de gasolina, Luciano Antonio Firmino, de 41 anos, pedreiro, e Ricardo Rodrigues dos Santos, de 35, motorista.

Eles participam do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).

Por volta das 6h30 de sexta-feira, os três faziam parte do grupo que bloqueou a Avenida José Pinheiro Borges, perto da Radial Leste, onde pneus queimavam.

Eis o relato do repórter Fausto Salvadori, postado no site Ponte Jornalismo:

As prisões aconteceram por volta das 6h40 de sexta, quando policiais militares pertencentes ao 4º Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia, grupo criado em 2014 para, entre outras atribuições, fazer “ações de controle de distúrbios civis e de antiterrorimo”) reprimiram com bombas um grupo de manifestantes que havia fechado a Avenida José Pinheiro Borges, perto da Radial Leste.
Os policiais afirmam que, durante a dispersão, detiveram Luciano com um galão de quatro litros de gasolina, que seria usado para incendiar pneus na pista, dois isqueiros e um saco com 137 pregos retorcidos, chamados de “miguelitos”, utilizado para furar pneus. Segundos a versão dos PMs, Luciano teria admitido que pretendia incendiar os pneus.
Depois que os manifestantes se reagruparam e foram novamente dispersados pelas bombas da PM, os policiais prenderam Juraci e Ricardo, acusando-os de terem disparado rojões contra eles. Ambos negaram as acusações e, na delegacia, se submeteram a exames residuográficos para detectar traços de pólvora nas mãos, que ainda estão sendo analisados.
Os policiais não apresentaram provas materiais nem testemunhas que comprovassem o suposto disparo de rojões. As testemunhas ouvidas no distrito policial, como o padre Paulo Sérgio Bezerra, pároco da Igreja Nossa Senhora do Carmo e um dos participantes do protesto, negaram ter visto rojões com os grevistas. “Todas as bombas que estouraram vieram da polícia”, disse o padre à Ponte.
O mesmo padre relatou que teve sua casa invadida pelos policiais do Baep, que entraram sem permissão em seu quintal para revistar o carro de Luciano que estava estacionado ali (veja o vídeo acima, feito pelo Mídia Ninja). A suposta invasão não consta do boletim de ocorrência elaborada pelo delegado Gomes. E, embora tenha recebido um pen drive com imagens da PM jogando bombas sobre os  manifestantes, o delegado restringiu a acusação de explosão a Juraci e Ricardo.

O vídeo mostra o padre dizendo aos policiais que não autorizava a entrada deles na propriedade.

Ainda assim, entraram e, ao que parece, nada encontraram no carro de um dos manifestantes, que estava estacionado ali.

Marcela Filus, que é juíza auxiliar na 1ª Vara Especial Cível de São Paulo e estava de plantão no dia 29, escreveu na decisão de manter os manifestantes presos que a entendia “necessária à garantia da ordem pública.”

Os três manifestantes trabalham e têm endereço fixo, mas a juíza não aceitou a substituição da prisão por outra medida cautelar, considerada por ela “insuficiente” para garantir a sequência do processo.

Marcela Filus faz parte de uma corporação que, segundo reportagem publicada na Folha de S. Paulo no mesmo dia 29, teve uma folha de pagamento com 70% dos juízes recebendo no mês de março acima do teto constitucional, que é de R$ 33,7 mil.

“O levantamento feito pela Folha apontou casos de pagamentos líquidos de mais de R$ 90 mil”, escreveu Fernanda Mena, autora da reportagem.

Tentei verificar o salário da magistrada no site do Tribunal de Justiça, mas o link que baixa a folha de pagamento não está funcionando.

Marcela Filus teve duas outras decisões que repercutiram.

Em 2010, ela mandou o UOL retirar do ar uma reportagem que tratava de uma decisão polêmica de outro magistrado, interpretada como a liberação de drogas no interior de presídios.

Marcela proibiu o site de criar outro fórum de discussão sobre a decisão do juiz.

Em 2014, ela negou ao hoje senador José Serra indenização que ele tentava cobrar da revista IstoÉ por uma reportagem sobre a denúncia de corrupção nas empresais estatais e trens e metrô.

“A atividade jornalística e os meios de expressão não se submetem ao contraditório. Não se pode compelir os órgãos de imprensa a oportunizarem defesa a todos os personagens de suas matérias e divulgações, sob pena de o Estado se imiscuir indevidamente na liberdade de informação”, sustentou a juíza.

Na prisão dos ativistas da greve geral, feita com base no relato dos policiais militares, a juíza Marcela Filus decretou a prisão com base nas acusações de “incitação ao crime, incêndio e explosão”.

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