
Pedro Serrano, jurista e professor da PUC-SP, analisou a situação de Donald Trump.
Os tribunais do Maine e do Colorado tornaram Trump inelegível nesses estados, mas a secretária de Estado da Califórnia, Shirley Weber, rejeitou a remoção do republicano das eleições primárias presidenciais, apesar do pedido do vice-governador.
O constitucionalista cita o caso de um homem da Ku Klux Klan que foi absolvido em 1969 e mostra que a compreensão de liberdade de expressão para os americanos pode contribuir para que Trump permaneça sem punição após uma tentativa de golpe.
Ele também falou sobre as condenações de golpistas do 8 de janeiro de 2023. Serrano acredita que o Brasil pode dar “um exemplo” nesses julgamentos em comparação aos EUA. Embora Bolsonaro ainda não esteja processado e punido pelo 8/1, Serrano acredita que o STF e o governo Lula estão cumprindo seu papel na defesa da democracia.
Confira os principais trechos da entrevista concedida ao DCMTV.
O caso que mudou a liberdade de expressão nos EUA
Tem um caso na Suprema Corte americana que demarcou o que é o direito de livre expressão.
O caso Brandenburg vs Ohio, de 1969, teve um homem processado que fez um discurso defendendo a prática de violência. Trata-se de Clarence Brandenburg, uma liderança da Ku Klux Klan, e ele foi inocentado.
Até então, nos casos anteriores, a Suprema Corte debatia qual era o critério e qual o limite da livre expressão. E tendiam a decidir que a mera evocação da violência caracteriza abuso do direito de livre expressão. Logo, seria um crime.
A jurisprudência ali mudou tudo. Nos casos anteriores em que houve condenação, era gente de esquerda propondo violência. Quando a Justiça pega o cara do KKK nos EUA, eles criam um novo entendimento.
O critério passou a ser outro.
O caso de Trump
Trump fez um discurso que provocou uma violência real, insurreição, crime de sedição. É um crime grave que ele provocou e não aconteceu nada com ele.
Para mim, o que tem de mais grave nos Estados Unidos não é se Trump será candidato ou não. Essa questão eleitoral é a mesma coisa do Bolsonaro.
A questão é puni-lo criminalmente pelo que ele cometeu. Ele convocou as pessoas a praticarem um ato de violência contra a democracia. E agora não vão condená-lo porque a maioria da Suprema Corte é trumpista.
Eles vendem pro mundo: “aqui se aplica a lei”. Se aplica nada! Se aplica a lei contra pobre, contra preto. Não se aplica a lei contra o rico branco. Há uma proteção indevida de quem comandou, porque o comando foi explícito, público, posto de forma clara.
Eu faço essa crítica sobre os Estados Unidos. Há esse debate dentro da comunidade jurídica americana. Trump comandou claramente um atentado contra a democracia e está saindo isento no plano penal.
Ele tinha que ser condenado criminalmente pelo que fez e não é uma questão eleitoral apenas.
Se você tiver estimulado crimes contra a democracia, você não pode ser candidato. Do jeito que está hoje nos Estados Unidos, Donald Trump vai se safar. Porque não há uma condenação criminal, transitado em julgado, contra ele.
Colorado barrou Trump nas eleições, É uma decisão de uma Corte que tem maioria democrata. Não sobrevive na Suprema Corte essa decisão. O que precisaria de fato é ele ter sido punido pelo fato de ter feito um discurso comandando uma violência contra a democracia americana. Uma violência que foi realizada.
Brasil tem chance dar um exemplo aos EUA
Temos muito esse espírito de falar mal do Brasil. Mas nós estamos dando exemplo para o mundo. O governo Lula através do Flávio Dino e do Capelli, além do Supremo Tribunal Federal, estão dando uma lição ao mundo.
Uma lição de como se defende a democracia. Tem alguns erros que podemos discutir aqui. Os erros do Supremo, faltas do ministro Alexandre [de Moraes].
Ele errou em manter essas pessoas presas preventivamente. Algumas delas até hoje. São equívocos.
No geral, o que interessa é que o governo brasileiro e o Supremo Tribunal Federal estão dando um exemplo ao mundo de como se defende a democracia.
Há muita crítica na sociedade americana e no meio jurídico especializado dos EUA sobre essa inação nos Estados Unidos. Há muita crítica e não é algo pacífico como a mídia brasileira quer dar a entender sobre a situação de lá.
A maioria dos juristas que eu conheço meio acadêmico norte-americano diz isso. Eu frequentei um período da minha vida lá. E tenho contato semanal com essa gente lá.
Tenho medo de que tenha havido algum tipo de abuso por parte do STF. Tem que ter cautela com relação à liberdade de expressão. Quando a liberdade de expressão passa pro campo de evocar violência, de estimular violência ou de praticar violência, aí não há dúvida de que se deve punir.
Isso não é protegido por direito à livre expressão. O que houve no Brasil seria crime em qualquer lugar do mundo. Teve um golpe violento na Bolívia, que foi concretizado. Aqui o golpe não foi concretizado.
A gente fica falando mal do nosso governo. Mas foi o governo Lula que conseguiu impedir um golpe junto do Judiciário. Num primeiro momento, foi o governo quem fez isso.
Pode-se criticar aqui ou ali, mas a realidade é que se impediu o cometimento de um golpe de Estado.
Veja a live na íntegra.
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