
Orlando Silva assumiu dois recuos importantes na PL 2630. Retirou a previsão da formação de uma entidade autônoma de supervisão das plataformas, por julgar que dificulta a aprovação. A oposição falava que estava sendo criado um “ministério da Verdade” orwelliano.
De fato, é necessário cuidado com um órgão desse tipo – imaginem como ele seria nas mãos de um Bolsonaro. Seria importante fixar em lei, com clareza, sua composição e atribuições.
Mas a aprovação do PL sem a previsão de uma estrutura de controle das plataformas gera o risco de que a lei se torne inócua.
O outro recuo foi a garantia do “livre exercício da expressão e dos cultos religiosos, seja de forma presencial ou remota, e a exposição plena dos seus dogmas e livros sagrados”. Em suma, a liberdade religiosa ganha primazia sobre a sanidade do debate público e a preservação de direitos fundamentais.
O problema é que a “liberdade religiosa” serve para acobertar muitos abusos – e o texto é vago demais para impedi-los.
A “liberdade religiosa” protege o pastor que se fantasiou de pai-de-santo para acusar orixás pela violência nas escolas? Protege as mentiras de Silas Malafaia sobre o processo eleitoral? Protege os ataques de pastores e padres contra a dignidade de mulheres e da população LGBT? Protege os esquemas de charlatanismo que, em tantas igrejas, drenam os recursos de fiéis desavisados? Protege lavagem de dinheiro?
A liberdade de expressão religiosa não pode servir de salvo-conduto para racismo, misoginia, homofobia. Nem para incitação à violência. Nem para abusos sobre os fiéis.
Quando fé e má fé se encontram, temos um problemão. A chantagem que os líderes das igrejas fazem sobre os políticos torna difícil enfrentá-lo. Mas, se não o enfrentarmos, nossa democracia nunca vai decolar.