A articulação política de Lula com Arthur Lira. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 6 de junho de 2023 às 16:29
Presidente Lula e o presidente da Câmara, Arthur Lira. Foto: Reprodução

Lula recebeu Arthur Lira para azeitar a articulação política do governo.

“Articulação política” é o nome bonito que se dá para a entrega de verbas e de cargos para o Centrão. Lira nem esconde isso: a franqueza é uma das suas qualidades.

“Franqueza”, no caso, é o nome bonito que se dá para a cara de pau.

A crer nos relatos da conversa, Lula pelo menos não perdeu o senso de humor. Teria dado conselhos para Lira provar sua inocência no escândalo dos kits de robótica.

A imprensa especula que até a cessão do Ministério da Saúde para o Centrão é possível. Não duvido. Eles vão exigir espaços que tenham visibilidade, orçamento robusto e forte lobby dos interesses privados – no caso, os tubarões dos hospitais particulares e planos de saúde, a quem sempre é lucrativo contentar.

Seria esse o preço para salvar o governo? Um novo preço, claro, junto com a democratização da comunicação ou a reforma urbana, que já foram rifados na composição ministerial, e o meio ambiente ou os povos indígenas, sacrificados para aprovar a MP da Esplanada.

Que governo está sendo salvo, então? Um governo acuado, que cede cada vez mais, que renuncia a tudo na tentativa de preservar o mínimo do mínimo. Uma renúncia que hipoteca também o futuro do país.

Um governo que fez um simbolismo bonito na subida da rampa, que pontilhou o primeiro e o segundo escalão com acenos a pautas identitárias, que tem um discurso correto em tantos assuntos, mas que vai continuar sendo incapaz de defender os interesses da classe trabalhadora, das mulheres, dos povos indígenas, da população negra, das comunidades LGBT, do meio ambiente, diante de um Congresso hostil e despudorado.

Agir para salvar Arthur Lira, no momento em que ele se vê mais enrascado, seria um grande erro – até porque não se pode esperar, da parte dele, nenhum tipo de gratidão. E ceder agora às pressões do Centrão, numa demonstração de fraqueza e de ausência de limites no leilão do Estado, é o caminho certo para ampliar sua avidez e terminar por deixar o governo inteiramente à sua mercê.

O que está sendo sacrificado não é secundário. São pontos centrais do programa vitorioso em outubro passado. E o que tem que ser salvo é mais que o governo. É um horizonte de transformação do país, na direção de mais justiça social e menos violência.

Antes de se entregar para ser preso, em meio à farsa da Lava Jato, Lula falou: “Eu não sou mais um ser humano, eu sou uma ideia misturada com as ideias de vocês”. O que está em jogo não é a sobrevivência política dele, do governo dele. É essa ideia que ele quer encarnar.

As circunstâncias são desafiadoras. Mas repetir um script que já deu errado dificilmente levará a um resultado positivo. Lula é o presidente da República, legitimado há pouco pelo voto popular. Tem recursos de poder para enfrentar as pretensões do Centrão e para mobilizar sua base. Está na hora de virar o disco e ensaiar novas estratégias.

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