A escandalosa diferença entre o que recebem os juízes e o salário médio dos trabalhadores no Brasil

Atualizado em 9 de agosto de 2018 às 11:13
Agora, o desafio é reconstruir a credibilidade

Se o Congresso Nacional aprovar o aumento de 16,3% que os ministros do Supremo Tribunal Federal incluíram na proposta orçamentária para 2019, vai aumentar a distância entre o que ganham os juízes e a média de salário da população.

Também aumentará a diferença entre os vencimentos dos ministros do STF e o salário mínimo.

Conforme lembra o repórter André Shalders, em reportagem na BBC Brasil, o mais recente relatório Justiça em Números, produzido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil tem hoje cerca de 18 mil magistrados (juízes, desembargadores e ministros).

Em média, cada um recebe R$ 47,7 mil por mês – incluindo salários, benefícios e auxílios.

Já salário médio dos trabalhadores, de acordo com o IPEA (instituto de pesquisa do governo federal), é R$ 2.154, segundo o último dado disponível, de dezembro de 2017 (talvez tenha caído). A diferença é, portanto, de vinte vezes em relação aos vencimentos médios dos magistrados.

Comparada apenas ao salário do ministro do STF, a diferença é de quase dezesseis vezes —em tese, esse salário deveria ser o teto do funcionalismo, mas, no Judiciário, não é, já que são computados os penduricalhos.

Com o reajuste, o salário do ministro será 18 vezes maior que a média dos salários dos trabalhadores.

Se os magistrados brasileiros entendem que estão ganhando pouco, ele deveriam verificar os vencimentos de seus colegas na Europa.

Em 2014, um magistrado no topo da hierarquia do Judiciário na União Europeia recebia, em média, 65,7 mil euros por ano. Ao câmbio de hoje, o valor equivaleria a cerca de R$ 287 mil – ou R$ 23,9 mil mensais.

Isso representa 4,5 vezes o salário médio do trabalhador europeu.

Os vencimentos dos magistrados no topo da carreira na Europa são muito inferiores ao que recebem os juízes brasileiros, mesmo se descontados os penduricalhos.

Com os penduricalhos, a diferença é ainda mais gritante: os magistrados das cortes supremas européias ganham pouco mais da metade do que recebe em média, por exemplo, um juiz federal da primeira instância.

A palavra final sobre o aumento será dada pelo Congresso Nacional, mas é difícil que rejeitem, já que os parlamentares têm interesse de reajustar os próprios vencimentos — e, de acordo com a legislação, o teto para eles é também os vencimentos do STF, que, em caso do reajuste, subiria para R$ 39,3 mil.

Comparados ao salário mínimo brasileiro, os R$ 39,3 mil pretendidos pelos ministros do STF são 39 vezes superiores (já considerado o valor de R$ 998 fixado para 2019).

Sob qualquer ponto de vista, um escândalo.

E um escândalo ainda maior se se considerar que, mantidos os salários dos magistrados, eles dão um jeito de colocar mais dinheiro no bolso — sem roubar.

O auxílio-moradia, por exemplo, foi uma forma de ampliar os vencimentos, como admitiu Moro. Mesmo quem tem casa na cidade em que reside — caso de Moro — recebe R$ 4,3 mil por mês. Ao ser questionado sobre o penduricalho, disse:

“O auxílio-moradia é pago indistintamente a todos os magistrados e, embora discutível, compensa a falta de reajuste dos vencimentos desde 1º de janeiro de 2015 e que, pela lei, deveriam ser anualmente reajustados”

Não são só os juízes que recebem auxílio-moradia. Os procuradores também. Deltan Dallagnol, por exemplo, tem casa em Curitiba, recebe o auxílio-moradia e investe em imóveis. Ele comprou duas unidades do Minha Casa, Minha Vida em Ponta Grossa.

Não é exagero dizer que o auxílio-moradia o ajudou a pagar pelos apartamentos populares, que tiveram valorização superior à variação da poupança.

Com o reajuste pretendido pelos ministros do STF, o salário dele também subirá. Todos os vencimentos do funcionalismo sobe, em efeito cascata. Com o tempo, poderá montar uma imobiliária.