A Faria Lima não vai a Bolsonaro. É Bolsonaro quem vai à Faria Lima. Por Denise Assis

Atualizado em 6 de abril de 2021 às 22:18

Publicado originalmente no Jornalistas pela Democracia

Por Denise Assis

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante cerimônia no Palácio do Planalto Foto: Evaristo Sá/AFP

Consciente de que a ladeira para um político que começa a descer, dificilmente tem o atalho para a subida, Bolsonaro tenta se agarrar a todos os recursos para enfrentar a corrida de 2022. Depois de ser alvo de uma carta com mais de 500 assinaturas de empresários e economistas com críticas contundentes à sua atuação – ou à falta de – no combate à pandemia, e a inação do seu ministro Paulo Guedes, que deixa derreter setores em que esses senhores investem, e não aprumam (só encolhem), ele apela.

De acordo com o jornalão carioca, Bolsonaro está convidando para um jantar, amanhã, em São Paulo, com cerca de 20 executivos. Um deles, Flávio Rocha, da cadeia de lojas Riachuelo, seu eleitor na eleição passada. A lista tem, ainda, nomes como o de Luiz Trabuco, do Bradesco. Alguns, porém, já anteciparam que não devem comparecer, pois estão em lockdown, preocupados – ao contrário dele – com o número assustador de mortes no país, pela doença Covid-19.

A tiracolo leva Paulo Guedes, o seu ex-posto Ipiranga, hoje um figurante sem fôlego, para explicar o imbróglio do orçamento, alvo de cortes de despesas obrigatórias para elevar em R$ 26 bilhões a emendas dos parlamentares, que o colocou numa sinuca de bico. Agora, se vetar  fica mal com a base. E se não vetar, pode ser processado.

A motivação do deslocamento de Bolsonaro até São Paulo pode ser explicada em números nada favoráveis, da pesquisa XP- Ipespe publicada hoje, e resultado do levantamento realizado nos dias 29, 30 e 31 de março. Nela o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aparece com 29% das intenções de votos, enquanto o atual ocupante da cadeira, 28%. Na pesquisa anterior, Bolsonaro estava à frente com 27%, e Lula com 25%. O dado mais preocupante é o da sua rejeição, que continua crescendo. Em outubro eram 31% os que consideravam o governo atual ruim ou péssimo; agora esse número saltou para 48%. No mesmo período, o número dos que avaliam o governo Bolsonaro como ótimo ou bom caiu de 39% para 27%. Isto, sem contar a avaliação do seu desempenho frente à pandemia, hoje na casa dos 60% de ruim e péssimo.

O esforço de Bolsonaro de ir atrás dos empresários pode até fazer efeito para a turma dele, concentrada no “Centrão” e os tais 14% de radicais. Porém, a julgar pela disposição já demonstrada na carta tornada pública, o grupo do empresariado já se lançou à árdua tarefa de buscar a tal da “terceira via”, seja lá o que vão conseguir construir a partir das teorias de Giddens. (Anthony Giddens, respeitado acadêmico que exerceu uma grande influência no Partido Trabalhista Britânico e que escreveu uma obra intitulada Para além da esquerda e da direita. , onde afirma que estas duas forças políticas estão ultrapassadas e propõe o que ele chama de “terceira via”, um caminho intermediário entre o neoliberalismo (direita) e o socialismo (esquerda) – incluindo aí uma das ramificações do socialismo, a chamada “social-democracia”). No livro, Giddens define a terceira via como “uma tentativa de transcender tanto a social-democracia do velho estilo quanto o neoliberalismo”.

Bolsonaro jamais deve ter ouvido falar em Giddens, mas sabe o que é o instinto de sobrevivência. Por isto faz o gesto desesperado de buscar os senhores da Faria Lima, que ele vê rumarem atrás dos nomes que podem compor a tal “terceira via”. Esses, já o abandonaram há um tempo e fizeram questão de tornar público o desembarque.

É possível que o encontro não dê quórum ou, ainda que aconteça, não resulte em nada além de gestos cordiais. Afinal, o que a pesquisa da XP-Ipespe deixa claro, é que  o país descobre, a cada dia, quem foi o culpado pela não compra de vacinas e quem é o “agricultor” de novas cepas da Covid-19, com o seu descaso pela doença. E quem quer apostar num candidato em queda?