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A imortalidade improvável do Black Sabbath

O que 70 mil pessoas foram fazer no Campo de Marte, por Asmodeu?

O que explica a longevidade do Black Sabbath, o quarteto formado em 1968 em Birmingham, na Inglaterra? Das bandas da sua geração, o Sabatth nunca esteve na mesma liga do Led Zeppelin, por exemplo, que tinha músicos melhores — e mais bonitos. Embora fizessem parte da mesma linhagem de descendentes do Cream, o power trio dos anos 60 que inventou o heavy metal, os quatro caras do Sabatth eram assumidamente menos sofisticados e esquisitões.

Ozzy era gorducho, o guitarrista Tony Iommi era lento (perdeu a falange de dois dedos na fábrica onde trabalhava). Os quatro pareciam saídos de um salloon vagabundo de um faroeste espaguete.

O maior crítico de rock de todos os tempos, Lester Bangs, desceu-lhes o cacete no primeiro disco. “Eles fazem jams descoordenadas em que o baixo e a guitarra se atropelam em seus perímetros musicais, nunca entrando em sincronia — exatamente como o Cream, só que pior”, escreveu. Mas Bangs acertou num vaticínio: “No rock, um dos princípios fundamentais é que erros — gloriosos — podem abrir caminho para novos estilos incríveis e tudo pode acontecer”.

Bem, aconteceu. O Sabbath inventou um estilo, capturou a imaginação de milhares de jovens com sua fanfarronice satânica, um papo furado tirado de filmes de B de horror, e virou a trilha sonora de milhões de meninos. Os riffs poderosos de Iommi estabeleceram um padrão, com seus solos em pentatônica menor. Ozzy virou um monstro carismático, com uma sintonia absurda com o público. Bill Ward (baterista) e Geezer Butler (baixista) eram a cozinha que os dois pediram a Deus.

O Sabbath não era cool. Não era bacana. Bruxas, rituais diabólicos, os músicos vestidos de preto… Nos anos 80, quando o rock ficou inteligente e de sexualidade duvidosa, o Sabbath virou piada. Mas não era. Era muito mais genuíno e cru do que aqueles rapazotes de laquê. Poucos anos depois, todas as bandas que usavam guitarras distorcidas se declararam fãs — de Nirvana a Metallica, de Guns’n’Roses a Sepultura — e o Sabbath virou um clássico.

Os show no Brasil têm Iommi, Ozzy e Butler. Ward não veio. Ozzy conseguiu se cobrir com a bandeira do Brasil num show na argentina. Pediu desculpas. Iommi está se tratando de um câncer na garganta. O Sabbath permaneceu o mesmo. Um erro glorioso que dura 45 anos — e que não corre mais o risco de ser esquecido. Ozzy tomou tudo o que existe na farmacologia e faz o tipo lesado, embora seja muito mais lúcido, talentoso e divertido do que, digamos, Lobão.

“Enquanto houver garotos putos da vida, que não têm como se livrar dessa raiva, o heavy metal vai viver”, diz ele. “Quem é essa porra de Justin Beber?”

Kiko Nogueira

Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

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Kiko Nogueira

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