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A nota da Abril sobre o fim da Playboy é um clássico do embromation nacional. Por Kiko Nogueira

“Foco no resultado”

 

Em 2005, três consultores americanos lançaram um livro chamado “Por que as pessoas de negócio falam como idiotas”. Era uma crítica aos jargões corporativos disseminados nas empresas de modo a esconder o real significado das coisas.

Expressões vazias como “agregar valor”, “foco no resultado”, “alinhar a gestão”, “fazer uma reengenharia”, “otimizar as práticas”, “mudança de paradigma”, “apostar na sinergia”, entre outras, são pragas que vieram para ficar.

O chefe burro que quer parecer inteligente falando em “aculturamento”, “objetivar” e “endereçamento” não irá embora nunca mais. Sob ele, uma legião de apaniguados acredita que aquela é a língua do sucesso.

A nota da Editora Abril sobre o fechamento da Playboy é, desde já, um clássico desse embromation. Mesmo para quem estava acostumado ao chamado “bolex”, o boletim executivo da casa, é impressionate.

Dona de um passado de glórias, a revista morreu por causa de uma septicemia — mulheres nuas a um clique do onanista, o envelhecimento da fórmula, os cachês impraticáveis das mulheres desejadas, as matérias irrelevantes etc.

(Um amigo atribui o fim ao abuso do recurso estúpido do “Rs”, abreviação de “risos”, depois de frases absolutamente sem graça, especialmente em entrevistas com luminares como o Roger do Ultraje ou Luana Piovani. Faz sentido.)

O comunicado oficial diz o seguinte:

“Dando continuidade à estratégia de reposicionar-se focando e dirigindo seus esforços e investimentos às necessidades dos leitores e do mercado, a Editora Abril deixará de publicar, em 2016, as versões brasileiras das revistas Men’s Health, Women’s Health e Playboy.

Esse movimento é parte de uma profunda e arrojada mudança da empresa, processo iniciado há cerca de um ano com a revisão do portfólio de produtos e a radical readequação das ofertas Abril à sua audiência, aos seus anunciantes e agências. Esse novo posicionamento compreende soluções cada vez mais eficientes, com a expansão digital fortemente ancorada por Big Data (ABD – Abril Big Data) e Branded Content (Estúdio ABC – Abril Branded Content).

(…)

O que estamos ofertando ao mercado publicitário com muito sucesso é a Jornada do Consumidor. Nossos anunciantes acompanham seu grupo definido de consumidores nos ambientes on e off-line – na web, nas redes sociais, em nossos sites, em nossas revistas, no mobile, onde seja -, entrando assim nas conversas que definem as decisões dos consumidores. Com a criação do Estúdio ABC e do Abril Big Data, o ABD, facilitamos a participação das marcas nesses encontros, nessas conversas. É o nosso expertise na criação de conteúdos e em encontrar os consumidores a serviço de nossos parceiros de negócios”.

 

“Estratégia de reposicionar-se focando e dirigindo seus esforços”? “Revisão do portfólio”? “Expansão digital fortemente ancorada”? Sem contar que ninguém sabe o que é Estúdio ABC ou Abril Big Data — nem mesmo na empresa.

Por que é incompreensível? Porque é feito para não ser compreensível. Não há mais possibilidade de agregar valor ao negócio. Esse blablablá pode ser resumido no seguinte: a casa caiu.

 

Kiko Nogueira

Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

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Kiko Nogueira

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