A primeira supermodelo. Por Paulo Nogueira

Siddal pelo marido Rossetti

A arte pela arte.

Foi este o lema de um movimento que nasceu na Inglaterra vitoriana da segunda metade do século XIX. O país vivia dias feios, trazidos pela rápida industrialização e por um sentimento dominante de utilitarismo. Isso quer dizer: o que era útil se sobrepunha a tudo.

Foi então que um grupo de artistas se insurgiu e estabeleceu a beleza somo o ideal a ser seguido. Eram os “estetas”.  Para eles, a arte não tinha que mudar o mundo e nem melhorar as pessoas. Tinha, simplesmente, que ser bela. O Victoria and Albert Museum traz uma exposição com alguns dos principais trabalhos desse grupo. “O Culto da Beleza” é o nome da exposição.

Vou, atraído sobretudo por um dos artistas: Dante Gabriel Rossetti.  Na juventude, antes de aderir aos estetas, ele fundara com alguns amigos em Londres a Fraternidade Pré-Rafaelita. Eram jovens sonhadores – todos na casa dos 20 anos – que tinham o desejo romântico de renovar a arte inglesa, para eles formal e enfadonha demais.

Mais que propriamente em Rossetti, que além de pintor era poeta, penso em sua musa e mulher, Elizabeth Siddal.

Numa biografia, Siddal foi definidida como a primeira supermodelo. Cabelos vermelhos, o que era um problema na época, visto que se achava que ruivos davam azar, muito mais alta e magra que a média, Siddal é provavelmente o rosto mais marcante da arte inglesa de seu tempo. Sua figura fascinantemente invulgar acabaria mudando o conceito de beleza na Inglaterra.

Ela foi dominante não apenas nos quadros do marido.

É ela, por exemplo, a cultuada Ofélia de outro pré-rafaelita, John Everett Millais. Siddal quase morreu ao posar como a Ofélia de Millais. Ela estava numa banheira cheia de água. Millais estava tão entusiasmado que esqueceu que a água podia esfriar. Siddal, profissionalíssima, não se manifestou. Pegou uma pneunomia da qual jamais se recuperaria.

Siddal como a Ofélia de Millais

Vida de supermodelo era bem diferente então.

Siddal foi descoberta numa loja de chapéus onde trabalhava. Nasceu pobre, viveu pobre, morreu pobre.

Tinha 32 anos quando se matou. Rossetti enterrou com ela poemas seus, mais tarde exumados rocambolescamente. Sua saúde estava consumida pelo vício em láudano, um remédio à base de ópio.

Mas seu rosto e corpo ficaram para sempre  como uma contrapartida luminosa de graça e beleza na sombria, esfumaçada, feiosa Inglaterra de seus dias.

Paulo Nogueira

O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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