Destaques

Apoiador do golpe contra Dilma e fiador do capitão, Estadão conta as horas para jogar Bolsonaro no lixo da história

Velhos e novos aliados do Estadão

A piada da vez do Estadão está no editorial “Ainda faltam 17,5 mil horas”.

O jornal começa 2021 dizendo que os dois primeiros anos da gestão Bolsonaro deixam claro o que está no horizonte para os dois últimos: ‘Obscurantismo, truculência e incapacidade administrativa’.

Diz que até aqui ‘não se tem notícia de que alguma das promessas formais de campanha de Bolsonaro tenha sido cumprida’.

Como assim?

E o desmonte da Previdência Social, como tanto desejaram os controladores do jornal?

A desregulamentação das leis trabalhistas por acaso não era uma pauta prioritária para a família Mesquita?

E que dizer da venda de estatais, do corte de gastos sociais e estímulo a setores privados em áreas essenciais como saúde e educação?

Existe uma única coisa que talvez justifique o cavalo de pau do matutino: Bolsonaro foi intrépido e rápido além do esperado para cumprir a pauta antipopular combinada com a elite. Agora ela não precisa mais dele.

É sempre bom lembrar que o Estadão foi aliado de primeira hora dos procuradores da Lava Jato e de Sergio Moro, que formaram um conluio para derrubar Dilma, entregar o poder a Temer e prender Lula. Desestabilizaram a democracia e a consequência foi Bolsonaro.

Dizer que o momento é de contar as horas é uma piada. De puro mau gosto.

Leia o Editorial

Se os dois primeiros anos da gestão de Bolsonaro servem de parâmetro para o que nos aguarda na segunda parte do mandato, o Brasil nada pode esperar senão mais obscurantismo, truculência e incapacidade administrativa, pois essa é a natureza de um governo cujo presidente não se elegeu para governar, e sim para destruir.

Não se tem notícia de que alguma das promessas formais de campanha de Bolsonaro tenha sido cumprida. Ele e seu “superministro” da Economia, Paulo Guedes, passaram quase toda a primeira metade do mandato a anunciar privatizações em massa, desenvolvimento econômico, criação de empregos, modernização do Estado e competitividade internacional. A frustração de todos esses retumbantes compromissos levou o ministro Paulo Guedes a anunciar: “Acabou. Não prometo mais nada”.

Também as alardeadas reformas foram ou esquecidas ou sabotadas por Bolsonaro justamente na época mais propícia para sua aprovação. Somente a reforma da Previdência foi aprovada, mas como resultado do esforço da liderança do Congresso, muitas vezes à revelia do presidente da República. 

Será uma surpresa se a pauta de reformas avançar na segunda metade do mandato, em meio ao previsível clima de campanha eleitoral alimentado pelo próprio presidente. Não há motivo para otimismo – e não há porque Bolsonaro não se mostrou competente nem mesmo para encaminhar as pautas ditas “de costumes”, tão caras ao bolsonarismo. Assim, como se vê, o governo do ex-deputado do baixo clero não se define pela capacidade de formular políticas – qualquer uma –, restando-lhe exclusivamente o discurso ideológico.

Nisso, Bolsonaro foi competente. Durante dois longos anos, conseguiu entreter o País com um misto de violência e escárnio pelas instituições, tão ao gosto de uma parcela reacionária da população para a qual a política não presta e democracia equivale a balbúrdia.

Bolsonaro passou a primeira metade de seu mandato a fazer o elogio do homem medíocre, menosprezando a respeitabilidade e rejeitando qualquer autoridade que não fosse a sua. Elevou a crueldade à categoria de virtude, contrariando valores humanitários, considerados hipócritas por ele e seus devotos. Ao fazê-lo, ofereceu a seus ressentidos eleitores a possibilidade excitante de mudar a história por meio do autoritarismo messiânico de seu “mito”.

Como em todo regime autoritário, programas partidários são irrelevantes – e Bolsonaro nem partido tem. O que interessa é a palavra do “mito”, que muda ao sabor das circunstâncias, tornando irrelevante até mesmo a assinatura de Bolsonaro em leis e decretos que ele não se envergonha de renegar ou esquecer quando lhe é conveniente.

Até aqui, Bolsonaro dedicou-se a criar um discurso em que todos são responsáveis pelos problemas, menos ele. E, como se trata de ideologia, pouco importa se o discurso é baseado em falsas premissas, como quando reitera a mentira segundo a qual não tem responsabilidade no combate à pandemia porque o Judiciário a atribuiu a Estados e municípios. O que importa é disseminar a impressão de que não o deixam governar, numa imensa conspiração.

Para que esse discurso funcione, é preciso desqualificar a imprensa profissional, que trabalha para revelar fatos concretos, e valorizar as redes sociais, que criam “fatos” sob encomenda. É o que Bolsonaro faz a todo momento. Nesse ambiente, todo aquele que é capaz de pensar e questionar torna-se automaticamente suspeito. Nada do que a experiência científica oferece é válido, pois tudo o que é preciso saber será revelado pelo “mito”, de acordo com a lógica de suas, digamos, ideias.

Nas 17,5 mil horas desse pesadelo que ainda temos pela frente, é preciso que a sociedade e as instituições democráticas impeçam Bolsonaro de completar sua obra deletéria. Se não se pode esperar que Bolsonaro se emende, ao menos é possível tentar reduzir os danos de sua catastrófica passagem pelo poder.

Jose Cassio

JC é jornalista com formação política pela Escola de Governo de São Paulo

Disqus Comments Loading...
Share
Published by
Jose Cassio

Recent Posts

Oposição quer levar caso da Sabesp ao STF após Justiça manter votação em SP

Os partidos de oposição planejam apresentar uma ADI ao STF após o Tribunal de Justiça…

4 minutos ago

Sumido, Mourão reaparece para sugerir GLO Eduardo Leite

O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) disse que conversou com o governador do Rio Grande do…

12 minutos ago

“Vai acontecer com frequência”, diz Carlos Nobre sobre crises climáticas como do RS

Em entrevista concedida ao DW Brasil, o climatologista Carlos Nobre, cuja carreira foi construída no…

39 minutos ago

A arapuca que direita gaúcha gostaria de armar para Lula. Por Moisés Mendes

Publicado originalmente no "Blog do Moisés Mendes" É romântica, altruísta e algumas vezes oportunista a…

40 minutos ago

Leite já discutiu com jornalista da Globo ao ser cobrado por crise climática no RS

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), já discutiu com o jornalista…

1 hora ago

Eduardo Leite pede doações ao RS e indica chave pix de “sindicato dos bancos”

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), disse que as doações em…

1 hora ago