Bolsonaristas tinham data limite para golpe contra Lula, diz PF

Atualizado em 10 de outubro de 2023 às 6:56
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Foto: Reprodução

Os últimos achados da Polícia Federal (PF) nas investigações relacionadas ao suposto golpismo envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro indicam um esquema complexo, envolvendo duas vertentes de organização e uma data-limite importante: 18 de dezembro de 2022, um dia antes da cerimônia de diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Fontes a par do andamento das apurações afirmam que as descobertas provenientes dos inquéritos sobre os incidentes de 12 de dezembro e 8 de janeiro, bem como as operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a influência das milícias digitais, sugerem a existência de dois núcleos agindo simultaneamente. As informações foram divulgadas pela colunista Malu Gaspar, do jornal O Globo.

Em um lado, estava o núcleo operacional, responsável pela organização de manifestações, bloqueios de estradas e tumultos, como o ocorrido em 12 de dezembro em Brasília, quando carros e ônibus foram incendiados após a prisão de um líder indígena, sob acusações de atos golpistas.

O outro núcleo era de natureza política, dedicado à criação de um “arcabouço legal” para justificar medidas excepcionais a serem tomadas assim que uma dessas iniciativas tumultuosas obtivesse sucesso.

Documentos como a “minuta do golpe”, encontrada na residência do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, ou o texto discutido por Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, com comandantes das Forças Armadas, faziam parte desses esforços.

Ambos os núcleos operavam de forma independente, com pouca interação entre eles, a não ser por alguns personagens-chave encarregados de garantir que ações bem-sucedidas de insurgência ou tumulto fossem seguidas por intervenção ou golpe. Mauro Cid e o ex-ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro, o general da reserva Walter Braga Netto, eram alguns deles.

A PF já coletou evidências de que havia membros das Forças Especiais na Esplanada dos Ministérios durante os tumultos de 8 de janeiro, aplicando táticas de insurgência e orientando os manifestantes a invadir as sedes dos Três Poderes.

Além disso, as investigações revelam que a data de 18 de dezembro era vista pelos conspiradores como o prazo limite para agir, pois, após a diplomação de Lula, seria mais difícil justificar medidas de força para manter a ordem.

O novo absurdo de Jair Bolsonaro sobre o 8 de Janeiro | VEJA
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Foto: Reprodução

Uma das evidências analisadas pelos investigadores é um áudio gravado no celular de Mauro Cid durante a Operação Venire da PF, que trata do “cronograma” do golpe. No áudio, Ailton Barros discute a estratégia, enfatizando a necessidade de um pronunciamento por parte de Bolsonaro ou do então ministro da Defesa, Freire Gomes.

Ainda segundo as fontes da PF, existem várias gravações semelhantes trocadas por Cid com outros interlocutores em diferentes datas, algumas envolvendo indivíduos com papéis mais relevantes que o do coronel Ailton Barros, cujo conteúdo permanece sob sigilo.

No áudio revelado pela CNN em maio passado, Ailton trata do “cronograma” do golpe: “Conceito da operação: Então, hoje já é meia noite e cinquenta e nove de quinta-feira, dia 15 de dezembro. É o seguinte: então, entre hoje e amanhã, sexta-feira, tem que continuar pressionando o Freire Gomes para que ele faça o que ele tem que fazer. Até amanhã à tarde (que seria o sábado dia 17), aderindo bem, ele faça um pronunciamento. (…) E se ele não aderir, quem tem que fazer esse pronunciamento é o Bolsonaro, para levantar o moral da tropa.” E depois de repetir o roteiro, Barros conclui: “Aí vai ser tudo dentro das quatro linhas”.

Em outra parte do áudio, ele menciona estarem “no limite da ZL” (Zona de Lançamento), uma expressão militar que designa a área ideal para iniciar uma ação. Ele enfatiza a importância de não ter mais oportunidades para agir, e questiona como o Brasil e a moral das Forças Armadas ficarão em caso de falha.

“Não vamos ter mais como lançar. Tem que dar passagem perdida. E aí, como vai ficar o Brasil, entendeu? Como vai ficar a moral dos militares do glorioso Exército de Caxias? Então, a primeira coisa é essa. É esse o pronunciamento ou do Freire Gomes ou do Bolsonaro até amanhã à tarde. E também até amanhã à tarde todos os atos, todos os decretos da ordem de operações já têm que estar prontos. Como é que tem que ser? Pô, não é difícil. O outro lado tem a caneta. Nós temos a caneta e temos a força. Braço forte e mão amiga. Qual é o problema, entendeu? Quem é que está jogando fora das quatro linhas? Somos nós? Não somos nós”, disse.

O plano descrito no áudio também inclui a prisão do ministro do Supremo e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, pela brigada de operações especiais de Goiânia, que é um dos locais de treinamento para as Forças Especiais do Exército. Outro local mencionado é Niterói.

Barros conclui mencionando a necessidade de agir na segunda-feira, lendo a portaria ou os decretos de Garantia de Lei e da Ordem (GLO) e mobilizando as Forças Armadas, cujo comandante supremo é o presidente da República. Ele ressalta a importância de agir rapidamente para proteger a reputação do Exército.

Embora a diplomação de Lula tenha ocorrido uma semana antes da data limite legal em 12 de dezembro, as investigações sugerem que os conspiradores continuaram a tramar conforme o cronograma original.

Participe de nosso grupo no WhatsApp, clicando neste link
Entre em nosso canal no Telegram, clique neste link