Bolsonaro partiu para o golpe. Campanha de Lula precisa dar passo à frente. Por Maringoni

Atualizado em 17 de julho de 2022 às 21:14
Bolsonaro conversando com militares das Forças Armadas
Bolsonaro com generais do Exército
Fernando Souza / AFP

Jair Bolsonaro e seus generais deram os retoques na pretensão de manter o poder a qualquer custo, diante das evidências crescentes de que, em condições normais de temperatura e pressão, sofrerão uma derrota acachapante de Lula. Isso se dará possivelmente no primeiro turno. E definiram duas etapas para concretizar a destruição da limitada democracia que temos. Farão de tudo para alterar as condições de temperatura e pressão.

1. A PRIMEIRA VIA É A DA POLÍTICA – A aprovação do esculacho constitucional, conhecido como PEC do Abismo não garantirá a vitória da extrema direita. Bolsonaro deve acumular alguns pontos favoráveis, mas estará longe de suplantar a folgada dianteira do ex-presidente. A PEC tem outro propósito: levar a disputa, com segurança, para o segundo turno. Nessa situação, com governadores, deputados federais e estaduais e senadores eleitos, o mano-a-mano se dará entre dois oponentes. Nessa situação, com uma eleição solteira, torna-se mais fácil investir contra a lisura das urnas, uma vez que a base política do governo já estaria garantida. Ponto fraco da argumentação: por que as urnas seriam confiáveis num turno e não em outro?

2. A SEGUNDA VIA É A DO TERROR – O desenho do golpe não é clássico. Nenhum tanque cercará o Congresso e o STF. Podemos ter uma situação semelhante à do golpe da Bolívia: diante de uma escalada de violência na sociedade – provocada por vândalos e milícias bolsonaristas -, o Exército e as PMs ficarão aquartelados, esperando a marcha dos acontecimentos. A fala do ministro da Defesa, general Paulo Sérgio, de não estar preocupado com violências no período eleitoral, trafega nessa via. Diante de uma situação de pânico popular, Bolsonaro e os generais entram em cena, avisando do envio de uma PEC ao Congresso para se adiar a eleição. Artur Lira e seus sequazes mostrarão serviço, a partir daí, ligando o trator e atropelando descontentes.

3. O JOGO ESTÁ JOGADO? Não. Temos 74 dias até o primeiro turno, tendo no meio o 31 de julho e 7 de setembro, quando o fascismo planeja grandes mobilizações. Podem ser grandes e podem ser um fracasso. Pode também haver mobilizações da oposição. O tempo político – que é diferente de tempo cronológico – tende a se acelerar e a realidade pode avançar aos saltos e sobressaltos.

4. É POSSÍVEL RESISTIR? Perfeitamente, meu senhor e minha senhora. Resistência aqui significa resistência de massas. Como se pode organizar a resistência é que são elas.

5. A CAMPANHA LULA ESTÁ DANDO UM SHOW DE BOLA, até aqui. Capta o momento político, amplia a frente antifascista, planeja manifestações e coloca gente em movimento. Ninguém além de Lula leva multidões às ruas, pelo lado da oposição. Nem centrais sindicais, nem movimentos sociais e nem ninguém mais. Resistência real teria de partir da campanha, ou não teremos resistência.

6. APESAR DO SHOW DE BOLA, a campanha Lula atua ainda na vaibe do espetáculo. Lula é um orador espetacular, denuncia as ações de Bolsonaro, lembra como foi a vida em seu governo e esboça o que vai fazer. Emociona e convence. Mas ainda atua como se estivéssemos em condições normais de temperatura e pressão, ou seja, numa campanha normal. Bolsonaro não. Bolsonaro bota cotidianamente pilha em suas matilhas.

7. A CONJUNTURA SE DETERIOROU MUITO na semana passada, a partir do assassinato de Marcelo Arruda, em Foz do Iguaçu. A violência e o clima de ameaças vão dando o tom na campanha. Apesar de Lula disparar na frente, quem se mexe e vai para a ofensiva é o fascismo. Isso precisa ser mudado.

8. NÓS NÃO VAMOS ENFRENTAR O FASCISMO no braço. E nem esperando que a mídia ou o empresariado optem claramente pela democracia. Os bolsonaristas estão armados e contam com a complacência do aparato de segurança. No quesito violência – terreno deles – levaremos a pior.

9. A MUDANÇA NECESSÁRIA À CAMPANHA LULA é que além de ser de massas, ela precisa se tornar dirigente. Não basta denunciar Bolsonaro com um microfone na mão. É fundamental dizer a todas e a cada uma das pessoas que vão aos atos e comícios o que elas têm de fazer. É preciso mostrar que a vitória não virá pela alta nas pesquisas, mas pela luta de milhões conversando e convencendo amigos/as e parentes em casa, no trabalho, no ponto de ônibus, no botequim etc. Os apoiadores de Lula têm de sair das manifestações com tarefas nas mãos. Têm de ser empoderadas pela campanha e para denunciar o golpe e ganhar votos.

10. NÃO NOS ESQUEÇAMOS dos imensos erros do governo Dilma às vésperas do golpe de 2016. A partir do segundo semestre de 2015, o golpe estava no Congresso, nas ruas e em toda parte. O governo teve tempo para organizar alguma resistência – o que não quer dizer que evitaria o golpe – mas preferiu não fazê-lo. A presidenta não chamou rede nacional, não falou à sua base social e, diante da oportunidade de ouro de denunciar a patranha na ONU, preferiu assistir passivamente o crescimento do tsunami reacionário. O golpe se instalou sem resistência significativa. Os protestos contra ele foram atos de vanguarda. O governo caiu sem resistência.

11. ESSA SITUAÇÃO NÃO PODE SE REPETIR. Há tempo para nos articularmos. Há tempo para resistir. Mas é preciso ajustar a campanha às condições totalmente anormais de temperatura e pressão – principalmente de pressão – dos dias que correm.